Wednesday 19 September 2012

Lições da Europa Central

Joseph Wood
Há alguns anos encontrava-me regularmente com representantes de Governos da Europa Central e, mais tarde, viajei pela região. Comecei a fascinar-me por este local por razões que, na altura, não me eram totalmente claras.

A “Europa Central” inclui uma variedade de pessoas e lugares diferentes. A Lituânia é em vários sentidos muito “católica”, mas a Estónia não. A República Checa e a Eslováquia são bastante diferentes, o que conduziu ao “Divórcio de Veludo” no fim da Guerra Fria. A Polónia e a Croácia têm raízes católicas profundas, mas que se desenvolveram de forma diferente do que na Hungria.

Os recentes desenvolvimentos politicos e económicos deixaram os países com tantas diferenças que alguns questionam se podemos sequer pensar neles como uma única região.

Mas quer esteja a visitar estes locais pela primeira vez ou os conheça desde toda a vida, apesar de, e na base de, todas as diferenças há uma semelhança clara que inclui o tempo, a arquitectura, a experiência histórica e a visão do mundo.

Nas minhas reuniões com representantes do Governo e com as pessoas que vim a conhecer através de contactos católicos, muitos dos quais eram, no início da década 2000, bastante novos para os cargos que exerciam, existia um elemento comum que passava por uma apreciação da liberdade que não era tão evidente entre os seus contemporâneos americanos e da Europa Ocidental. Um deles explicou-me que os seus pais tinham sido informados que ele teria melhores possibilidades de suceder na escola caso eles deixassem de ir à missa. Este tipo de assédio era o normal.

Uma das razões por detrás do meu fascínio pela região é de que alguns – embora não todos – os católicos e protestantes sobreviveram com a fé intacta, não obstante o poder do Estado burocrático-administrativo moderno. Esse Estado procurou, com grande vigor e a melhor tecnologia da época, secularizar a sociedade e limitar a religião, na melhor das hipóteses, aos edifícios religiosos cuja existência ainda era tolerada. Talvez tenhamos algo a aprender com essa experiência.

John Hittinger, da Universidade de St. Thomas em Houston, descreveu recentemente a semelhança entre a nossa situação e a deles. Ele cita os avisos, feitos há meses pelo Cardeal George, sobre os efeitos do Decreto HHS sobre o fornecimento decontraceptivos, que para todos os efeitos obriga as instituições católicas a secularizar-se ou a fechar. O Cardeal sublinhou que a liberdade religiosa também era garantida na Constituição soviética, embora a realidade fosse bem diferente e altamente restringida. Alguns líderes da Igreja Ortodoxa Russa tinham postos na KGB.

Uma das várias igrejas transformadas em
"museu do Ateísmo" pelos soviéticos.
O católico que se opôs com mais vigor a esta realidade da Guerra Fria foi, claro, o Cardeal Wojtyla da Polónia, mais tarde João Paulo II. Ele desenvolveu um plano de quatro pontos para a Igreja nessas circunstâncias: “1) Apelar aos direitos da lei e da moralidade para combater as agressões injustas às suas acções e instituições; 2) Ser acima de tudo professor, explicando a verdadeira fé e as suas aplicações a todas as esferas da vida...; 3) Usar oportunidades dramáticas para expressar a solidariedade com aqueles católicos que estejam a ser atacados e as instituições que estão a ser subvertidas; celebrar as efemérides e os heróis da fé nos seus próprios países; 4) desafiar fortemente e contrariar a táctica de ‘dividir no topo e na base’, empregue pelo Estado, e estar a postos para impôr as práticas doutrinárias e disciplinares requiridas para manter a unidade da fé”.

Fácil de dizer, difícil de cumprir. O Papa ganhou a guerra, mas nas batalhas que se desenrolaram, na Polónia e noutros locais muitos, (incluindo clero) foram tragicamente cooptados pelo Estado e colaboraram com o seu programa.

O que se passou nesses anos e que permitiu que o Cristianismo sobrevivesse na Europa Central parece ter sido apenas o mais recente episódio do que o padre Stanley Jaki, da Hungria, descreveu no seu recente livro Archipelago Church. Ele argumenta que a Igreja, tanto no passado século como sempre que se fizeram sentir as “tempestades morais da destruição”, é na verdade um arquipélago composto por ilhas de santidade e verdade, mais do que um continente inteiro. Os santos sustentam estas ilhas ao longo dos séculos, embora as suas posições mudem consoante as contingências da história.

Estas ilhas existiram e continuam a existir também na Europa Ocidental, onde a secularização continuou a toda a velocidade nos últimos dois séculos, mesmo sem a assistência de regimes comunistas. Por toda a Europa sentiu-se um problema diferente mas igualmente importante, a colaboração na secularização por parte de uma igreja financiada pelo Governo e legalmente instituída que é dependente de um grande aparato estatal.

O nível de financiamento que as instituições católicas recebem do Governo federal nos Estados Unidos cria tensões similares, entre resistir ao Estado quando este abusa da sua autoridade e o risco de perder o dinheiro público que sustenta as obras da Igreja. Os católicos americanos tendem a apoiar os grandes programas sociais do Governo. Com a aumento de recursos por parte do Governo para financiar esses programas vem também mais poder, que pode ser usado para qualquer coisa, como por exemplo o decreto HHS.

As ilhas deste arquipélago formam o “organismo vivo” da Igreja, com as suas estruturas eclesiais a compor o esqueleto necessário. A novidade do século passado, na opinião do padre Jaki, foi o reconhecimento do papel dos leigos, que culminou no Concílio Vaticano II, (um concílio para o qual reservava críticas consideráveis). Para sustentar e fazer avançar este arquipélago, para implementar o plano do Cardeal Wojtyla, os leigos terão de desempenhar um novo papel em conjunto com a hierarquia. O papel dos leigos será precisamente um dos grandes temas do ano da Fé que se aproxima e que começa no dia 11 de Outubro.

A América está ainda, esperamos, muito longe da Europa Central dos anos 60, e seria errado compararmos a nossa situação à dos cristãos que tiveram de defrontar o Leviatã comunista. Mas aqueles que emergiram da região nos meados do século XX, com a experiência daquilo que acontece quando o Estado Secular procura limpar os espaços públicos de qualquer influência religiosa, têm muito para nos ensinar neste momento da nossa história.


(Publicado pela primeira vez no Sábado , 15 de Setembro 2012 em http://www.thecatholicthing.org)

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