Robert Royal |
Não sei se é hoje* que o Supremo Tribunal vai dar a conhecer a sua decisão no caso Dobbs. Nem sei se, quando o fizer, a decisão será idêntica ao rascunho de Samuel Alito, que reverte o Roe v. Wade. O que sei é que seja qual for a margem que o Tribunal dará para que se limite o direito ao aborto, o resultado não serão manifestações “maioritariamente pacíficas”, mas sim a violência.
Os radicais pró-aborto já
levaram a cabo ataques contra centros de aconselhamento pró-vida e houve vários
incidentes suspeitos em igrejas por todo o país. Os mesmos grupos já prometeram
muito mais para o verão e para o outono, e já estão a organizar os “Dias da Ira”.
Uma vez que nós temos sido os
mais visíveis defensores da protecção de toda a vida humana, desde a
concepção até à morte natural, as igrejas católicas irão ser um alvo
específico. Por isso chegou a hora de também nós – não apenas os bispos e os
pastores, mas todos os católicos – nos organizarmos para o que aí vem.
Não podemos depositar
demasiada confiança nas instituições governamentais. Olhem só para a forma como
responderam ao caso do jovem tresloucado que ameaçou matar o juiz Brett
Kavenaugh. É verdade que ele foi detido e acusado – depois de se entregar.
Mas pouca coisa foi feita para evitar que outra pessoa fizesse o que ele apenas
ameaçou.
A questão do aborto está de
tal forma politizada que Nancy Pelosi tem travado legislação no Congresso que
forneceria mais protecção para os juízes, suas famílias, escrivães e
empregados, dizendo que “ninguém está em perigo”. Claro que estão, mas
admiti-lo poderia ofender os seus constituintes.
Entretanto o grupo pro-aborto Ruth Sent Us deu a entender num tweet, na Quinta-feira,
que está a vigiar Ashley, a mulher de Kavenaugh, e que sabe onde é que dois dos
seus filhos vão à escola.
O mesmo grupo divulgou a morada da juíza Amy Coney Barrett, bem como o facto
de ela ir diariamente à missa e de enviar os seus sete filhos para uma escola
do grupo cristão People of Praise. (Também já chamou à Igreja “uma instituição
para a escravatura das mulheres”.)
E Samuel Alito está num abrigo
secreto.
Isto é tudo saído diretamente
do manual de instruções da Mafia: “Belo estabelecimento que aqui tem. Seria uma pena
se alguma coisa lhe acontecesse.”
Se ainda vivêssemos num Estado
de Direito, as pessoas da Ruth Sent Us que foram responsáveis pelo envio
daqueles tweets já estariam presas. O facto de não estarem – e os media
ter-nos-iam dito se estivessem – mostra-nos bem como serão tratados os
protestos e a violência depois de sair a decisão de Dobbs.
Mostra também como é que o
Twitter, que é tão sensível a mensagens que fazem as pessoas sentirem-se
“inseguras” (algumas pessoas, pelo menos), se comportará nesta situação.
Juntamente com outros meios de comunicação e redes sociais.
O procurador-geral Merrick Garland
disse que este tipo de ameaças é intolerável numa sociedade civilizada.
Mas onde está a acção? Não apenas as protecções nominais para aqueles que estão
a ser ameaçados, ou a investigação de grupos violentos, mas o poder robusto da
lei.
Protesto à porta de casa de um juiz do Supremo Tribunal |
Entretanto, vêm aí os Dias da
Ira. Temos de começar a pensar como vamos responder. No país do Papa Francisco,
Argentina, feministas radicais tomaram de assalto e incendiaram igrejas e
escritórios governamentais. (Vejam aqui um exemplo). Leigos católicos têm tido que formar cordões para as
impedir.
Na minha paróquia tivemos dois
carros da polícia estacionados junto à Igreja no domingo depois da fuga do
rascunho de Alito. Mas é evidente que o perigo só vai aumentar exponencialmente
quando a decisão for oficial. Todos os bispos e todos os párocos no país deviam
estar a pensar – agora mesmo, antes de começarem os problemas – sobre quem
deverá ser chamado para responder aos protestos e à violência.
Eu já disse ao meu pároco que
estou disposto a ir para as barricadas, se chegar a tanto. Esperemos que não
chegue.
Mas ao nível local vamos
precisar dos conselhos de antigos polícias e ex-militares, pessoas habituadas a
lidar com o mínimo de força indispensável com indivíduos e multidões. Responder
com violência equivalente seria adoptar os métodos dos nossos adversários.
É triste pensar que a América
também já chegou a este ponto, mas a culpa é do próprio tribunal, por ter
inventado um direito constitucional ao aborto.
Os meus amigos europeus
dizem-me às vezes que nos seus países há menos comoção pública sobre o aborto
porque, em vez de ser uma decisão imposta por decreto pelos tribunais, as leis
foram mesmo debatidas pelas suas legislaturas. Ao contrário do que os grupos
pró-aborto afirmam aqui na América, a maioria dos países europeus têm
restrições ao aborto semelhantes ao que o Estado de Mississippi procura na lei
Dobbs: aborto legal até às 15 semanas e mais limitado a partir daí.
É evidente que as pessoas na
Europa arranjam formas de contornar a lei, e mesmo o aborto feito apenas no
primeiro trimestre não deixa de ser uma abominação. Mas é revelador da nossa
condição social que mesmo a lei do Mississippi, que corresponde basicamente ao
consenso liberal da Europa, é vista por cá como extremista e um atentado
radical aos direitos das mulheres.
Agora vamos ter de debater
essas questões ao nível estadual.
Entretanto, muitos de nós seremos
chamados a chegar-nos à frente, literalmente, para proteger as nossas igrejas e
outras instituições que defendem o simples princípio de que a vida humana
inocente é sagrada. Esse é um princípio do direito natural, uma conclusão a que
se chega através do bom uso da razão e não – como dizem até alguns católicos,
como o presidente Biden – a imposição de um dogma religioso aos cidadãos
americanos.
As pessoas por vezes brincam, dizendo
que se o grande céptico Voltaire voltasse hoje ficaria chocado ao descobrir que
a Igreja se tornou a maior defensora da razão humana no nosso mundo pós-moderno
e radicalmente relativista. E talvez ficasse ainda mais espantado ao ver
católicos, e outras pessoas de boa-vontade a chegar-se à frente, como agora
somos chamados a fazer, em defesa da razão – e da vida humana.
* As decisões do Supremo Tribunal são divulgadas às segundas-feiras. Não foi no dia 13, mas pode ser no dia 20 ou no dia 27 de Junho - Tradutor
Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é
A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press. The God That Did Not Fail: How Religion Built and Sustains the West está também disponível pela Encounter Books.(Publicado pela primeira vez
em The Catholic Thing na Segunda-feira, 13 de Junho de
2022)
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