O Metropolita Hilário, que era diretor do Departamenteo de Relações Externas do Patriarcado de Moscovo, foi removido desse cargo e nomeado responsável da diocese da Igreja Ortodoxa Russa na Hungria.
Para terem ideia do grau desta despromoção, Hilário era, na qualidade de director de Relações Externas, uma espécie de Ministro dos Negócios Estrangeiros do Patriarcado de Moscovo e tornou-se assim uma das figuras mais conhecidas da Igreja Russa. Viajava com frequência e era muitas vezes sobre ele que recaía a responsabilidade de defender as posições e a influência da Igreja Russa, algo que continuou a fazer durante esta guerra.
Já enquanto bispo da Igreja na Hungria, terá a seu cargo um total de 11 paróquias e oito padres. Seria mais ou menos o equivalente ao Papa mudar o cardeal Parolin para uma diocese no sudeste asiático.
É certo que a Hungria é um país importante para a Rússia, mas na qualidade de diretor das relações externas Hilário tinha tanta ou mais capacidade de visitar e cultivar as relações diplomáticas com o regime húngaro do que terá sendo, na prática, um bispo de uma diocese negligenciável.
O que conduziu a esta decisão? Aqui há algumas pistas. Este artigo indica que recentemente Hilário parecia estar a tentar distanciar-se de Cirilo. Durante uma visita a Chipre, para participar num encontro do Concelho Mundial das Igrejas, ele teve um encontro pessoal com o líder da Igreja Cipriota Ortodoxa, o que é assinalável porque essa é uma das igrejas que reconheceu a autocefalia da Igreja Ortodoxa da Ucrânia, levando à quebra de comunhão entre ela e a Igreja Russa. Aos olhos de Cirilo, portanto, a Igreja Cipriota é "inimiga" e pelos vistos ele não gostou do encontro.
Mais tarde, em comentários feitos à imprensa russa, Hilário mostrou esperanças de se poder chegar a um entendimento com as Igrejas com as quais existe uma quebra eucarística, dizendo mesmo que não devem ser consideradas inimigas.
Tudo isto foi feito na sequência da tentativa da Igreja Ortodoxa da Ucrânia, que continua formalmente ligada a Moscovo, se separar da influência de Cirilo. É possível que Hilário tenha entendido, como eu refiro aqui, que esse pássaro já voou... A Rússia perdeu toda a influência que podia ainda exercer sobre a Igreja Ortodoxa na Ucrânia, e por isso não vale a pena continuar a alimentar uma cisão intra-ortodoxa por causa de uma Igreja que já não quer nada com Moscovo de qualquer maneira.
Mais interessante é o facto de Hilário ter liderado a delegação russa presente no tal encontro inter-ortodoxo do Conselho Mundial das Igrejas e de não se ter oposto a que essa organização, no seu documento final, manifestasse uma forte condenação da invasão da Ucrânia (ver ponto 24). A declaração foi aprovada por unanimidade, o que significa que Hilário votou a favor.
Tanta coisa em tão poucos dias não passou despercebida a Cirilo, que percebendo que já não tinha em Hilário um aliado fiel, o despachou.
Resta ver agora se Hilário, cuja inteligência e sagacidade são notórias, conseguirá salvar a sua reputação aos olhos do resto do mundo, ou se esta já está demasiado danificada por anos de seguidismo ao regime de Putin.
[Actualizado]
Hilario esteve em Portugal há uns anos a convite da Fundação A Junção do Bem.
ReplyDeleteBem sei! Tive a interessante experiência de o entrevistar. Essa entrevista foi depois publicada em formato livro, juntamente com o texto da sua intervenção na Universidade Católica.
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