Casey Chalk |
Recentemente
uns amigos meus perderam um bebé, nado morto às 24 semanas. Entre a tristeza do
momento, o meu amigo decidiu dar nome ao bebé e ligou ao pároco para pedir que
se celebrasse uma missa. Num dia frio, no início de Janeiro, vários amigos
compareceram. O padre celebrou de forma respeitosa e séria e pregou uma homilia
sobre o arquétipo do sofrimento, Job, oferecendo o sacrifício da missa pela
alma do pequenino.
No
momento não foi fácil perceber o que os meus amigos acharam da celebração – naturalmente eles estavam com ar demasiado pesaroso para que sequer
falássemos no assunto. Mas uma semana mais tarde, à volta de umas cervejas, ele
disse-me o quanto aquela missa tinha significado para ele e para a família,
tanto como forma de honrar a vida do seu filho, como de dar sentido à sua
perda. Observando a sua mágoa à distância lembrei-me de uma coisa que me
ocorreu pela primeira vez quando, já católico, frequentei o funeral evangélico
do meu pai, em 2013: é importantíssimo que a Igreja Católica seja a melhor a lidar com a
morte.
O catolicismo tem várias vantagens sobre outras tradições religiosas,
mais ainda sobre a sociedade secular. A começar pelo espaço físico onde
honramos os mortos. As paróquias católicas, ainda que a arquitectura de algumas
deixe muito a desejar, são locais sagrados, nem que seja só pela presença de
Jesus no sacrário. Se para além disso houver beleza estética na arquitectura,
arte ou decoração interior, melhor. O funeral do meu pai, por mais respeitoso
que tenha sido, teve lugar numa sala de conferências alcatifada, com cadeiras
desdobráveis, parecia um salão de hotel. Não teve nada de particularmente
sagrado ou especial.
Depois
temos a doutrina a nosso favor. Claro que devemos aderir aos ensinamentos sobre
morte, Céu, Inferno e Purgatório porque acreditamos que são verdade. Mas independentemente
disso, oferecem-nos muito mais, em termos de contemplação e participação, do
que se encontra noutros lugares.
Nós
podemos rezar pelos nossos mortos, de forma a acelerar a sua entrada no Céu. Podemos
pedir aos nossos mortos, tanto no Purgatório como no Céu, para rezarem por nós.
E podemos comungar com eles no milagre que é a Missa, uma vez que a Eucaristia
é uma re-representação não apenas do Calvário, mas do banquete celeste, onde
todo o povo de Deus, morto e vivo, está presente.
Isto
é muito melhor do que os aforismos secos como “ele agora está num sítio melhor” e é mais robusto do que a crença protestante de que apenas veremos os nossos
entes queridos no Céu (desde que tenham sido salvos, claro).
Gosto
especialmente dos santinhos que se fazem depois da morte de alguém. Guardo os
santinhos de ambos os meus avós católicos e uso-os como marcadores de livros,
lembrando-me assim de rezar por eles. É fantástico como a mera visão dos
santinhos desperta não apenas orações como também contemplação sobre as suas
vidas e a minha. Também temos a tradição de acender velas e oferecer missas
pelos nossos entes queridos. O catolicismo coloca à nossa disposição uma rica
tapeçaria de formas de honrar os nossos queridos através de Cristo.
Não
quero com isto dizer que não seja possível também aos católicos serem maus a
lidar com a morte. Fiquei irritado, mas não muito surpreendido, quando vi que o aviso para o funeral do meu
pai chamava ao evento uma celebração da sua vida. Mas
isto tem-se tornado mais comum até nos enterros católicos. Já fui a funerais
católicos em que não se fala do Purgatório nem das nossas orações pelos mortos,
como se fosse simplesmente doloroso de mais contemplar a continuação do seu
sofrimento. E já fui a enterros em que o padre parecia sugerir que os mortos
estavam definitivamente no Céu, como se fosse possível ter essa certeza.
Há
uma pagela bastante popular que se vê nos enterros e que diz o seguinte:
Não
faças luto…
Nem
fales de mim com lágrimas…
Mas
ri-te e fala de mim…
Como
se estivesse ao teu lado.
Amei-te
tanto…
Estar
aqui contigo foi o paraíso.
Gustave Courbet |
Este
tipo de sentimentos são insultuosos para nós e para os mortos. Claro que
devemos fazer luto pelos mortos e lamentar a sua perda. A morte é uma realidade dolorosa e
terrível da condição humana. Muitos morrem em alturas, ou de formas, que não
fazem sentido para nós, deixando os seus familiares de luto mas também,
frequentemente, num estado de pobreza emocional e financeira.
São
Paulo declarou que com a ressurreição de Cristo a morte tinha sido derrotada e
perdido o seu ferrão, mas nunca disse que deixaríamos de sofrer com ela (1
Coríntios 15,55). Mais, o Céu não é uma espécie de expoente máximo das relações
terrenas, mas sim o local para onde os fiéis que morrem vão e onde, se Deus
quiser, um dia nos juntaremos a eles. Confundir a terra e o Céu é uma forma de
empobrecer ambos.
Mas
não tem de ser assim. A Igreja Católica possui os instrumentos e a doutrina
para nos ajudar a sofrer a tragédia da morte de uma forma que nos conforta,
guia e restaura. Quando a Igreja se vale destes dons faz muito mais do que
ajudar os enlutados a lidar com a sua perda; honra a Deus, orientando os nossos
corações para o louvar.
Reconhece
que, nas palavras de São Paulo, somos os mais miseráveis de todos os homens se
a Ressurreição não for verdade. Contudo, à luz da encarnação e da ressurreição,
temos uma esperança que vai para além de todo o sentimentalismo secular.
Ser
o melhor a lidar com a morte é também uma forma de pregar a verdade, tanto para nós, que
precisamos tanto dela – especialmente quando estamos emocionalmente vulneráveis
– como para os que tomam parte da nossa dor. Que melhor forma haverá de pregar
o Evangelho aos descrentes e não praticantes do que mostrar-lhes o facto de
que, através de Cristo, a morte não é o fim? Que melhor instrumento de
evangelização haverá do que uma missa solene que demonstra, em Cristo, o nosso
amor por, e união com, os que amamos?
A Igreja Católica pode
ser a melhor a lidar com a morte. E devia sê-lo, como parte da nova
evangelização.
Casey
Chalk escreve para a Crisis Magazine,
The American Conservative
e a New Oxford Review. É
licenciado em história e ensino pela Universidade de Virgínia em tem um
mestrado em Teologia da Cristendom College.
(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no domingo, 2 de fevereiro, de 2020)
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