Ontem perdemos. Não há outra
forma de o dizer. Perdemos e por muitos.
O jogo não acabou, mas as possibilidades
de travar a eutanásia por via política são praticamente nulas.
Mas a luta não acabou. Mudou foi
de campo. Agora, mais do que nunca, nós podemos fazer a diferença. E sabem como
é que podem fazer a diferença? Parem de dizer que a vossa avó já não é a vossa
avó.
Mais do que meter na cabeça,
temos de passar à prática o facto de que a identidade das pessoas, a sua
dignidade e essência, não estão vinculados à sua sanidade mental, à sua destreza
física ou à sua autonomia.
Aquela senhora que parece a
vossa avó mas já não vos reconhece, que já não sai da cama, que se baba e usa
fraldas, não é uma ex-pessoa, não é um ser que deixou de ser humano. Aquela mulher
continua a ser a vossa avó. É mulher, é humana e não perdeu um pingo da sua
dignidade.
O argumento a favor da
eutanásia assenta na ideia de que as pessoas podem perder valor. Não podem. Não
queremos viver num mundo assim.
Quando a vossa avó for mordida
por um zombie e se transformar, aí – mas só aí – podem usar essa expressão. Até
lá, não obrigado.
Outra coisa que podem deixar
de fazer é falar de pessoas como um fardo, e com isto refiro-me a vocês mesmos
também.
Por mais que se fale em morte
digna, em sofrimento insuportável e respeito pela dignidade, sabe-se que muitas
das pessoas que optam pela eutanásia, ou contemplam a possibilidade, o fazem
porque não querem ser um fardo para os outros.
Não há palavras para expressar
o triste que isto é. É uma falsa compaixão – bem-intencionada, sem dúvida – que
tem efeitos terríveis. As pessoas não são fardos. Cuidar de quem precisa não é
um castigo, não é fardo nem é fado. É difícil, sim, mas tem de ser encarado
mais do que como uma obrigação, como um privilégio.
Um dia, Deus queira, serei eu
a cuidar dos meus pais, como eles cuidaram dos meus avós e – espero bem – um dia
serão os meus filhos a cuidar de mim. Isto não é trágico, é belo. Pode ser
sujo, difícil, cansativo, mas é um privilégio.
E por isso nunca falem de
ninguém como sendo um fardo e nunca, mas nunca, digam que não querem ser um
fardo na vida dos outros, porque podem pensar que estão a ser queridos e
altruístas, mas o que estão a dizer na verdade é que também não querem que os
outros sejam fardos na vossa vida.
Por fim, lembrem-se que há
muitos que não têm sequer “outros” que possam cuidar deles. Para esses o drama chama-se
solidão. Ou então têm “outros” que não prestam, que não querem saber, que mais
valia não serem.
Pode ser que tenhamos
oportunidade de ser os “outros” certos para essas pessoas. Isso é um acto de heroísmo
a que todos devemos aspirar.
Se vivermos assim, se falarmos
assim, se pensarmos assim, podemos não mudar lei alguma, mas faremos mais pela
dignidade humana do que todos os políticos que tanto gostam de a invocar.
Isso mesmo, inteiramente de acordo.
ReplyDeleteQuem são esses ditos políticos para decidir o que quer que seja neste assunto...
A esses senhores só posso dizer: somos uma família privilegiada,com uma mãe, avó, bisavó de 96 anos. Lamento que nunca tenham sido capazes de fazer-se amar ao ponto de encontrar na EUTANÁSIA a solução para as suas incompetências afetivas. Daí a impô-las! Não deixaremos que aconteça, vai depender de nós.
ReplyDeleteFilipe, este texto foi publicado na internet por Jorge Duarte da Silva. Não sei se é uma história verídica, mas corresponde exactamente ao que penso, ao que sinto e ao que se fala neste post.
ReplyDeleteCristina Maria
"Um senhor de idade chegou a um consultório médico, para fazer um curativo na sua mão, na qual havia um profundo corte.E muito apressado pediu urgência no atendimento, pois tinha um compromisso.
O médico que o atendia, curioso perguntou o que tinha de tão urgente para fazer.
O simpático velhinho lhe disse que todas as manhãs ia visitar sua esposa que estava em um lar para idosos, com mal de Alzheimer muito avançado.
O médico muito preocupado com o atraso do atendimento disse:
– Então hoje ela ficará muito preocupada com sua demora?
No que o senhor respondeu:
– Não, ela já não sabe quem eu sou. Há quase cinco anos que não me reconhece mais.
O médico então questionou:
– Mas então para quê tanta pressa, e necessidade em estar com ela todas as manhãs, se ela já não o reconhece mais?
O velhinho então deu um sorriso e batendo de leve no ombro do médico e respondeu:
– Ela não sabe quem eu sou… Mas eu sei muito bem quem ela é!"
Há histórias que são verdadeiras, quer sejam factuais ou não. Obrigado pela partilha!
Delete