Randall Smith |
“Toma, pois, cuidado contigo! Guarda-te bem de esquecer
os factos que os teus olhos viram; que eles nunca se afastem do teu coração em
todos os dias da tua vida. Ensina-os aos teus filhos e aos filhos dos teus
filhos.” (Deuteronómio 5,9)
Há dois erros contrários, mas de igual gravidade, que são
cometidos em relação à educação secundária católica. Ambos são bem-intencionados,
mas são fatais para o futuro da Igreja.
O primeiro erro é tratar o colégio católico como se fosse
uma escola pública mas com missa e depois começara a pensar nela como a maior
parte das pessoas pensam sobre as escolas secundárias, como um meio para entrar
numa “boa universidade”. Importa manter as notas altas, mas frequentemente
essas notas estão dissociadas de qualquer capacidade real de fazer coisas como
ler livros complexos, escrever prosa literária ou conseguir edificar um
argumento consistente. “Manter as notas altas”, para quem pensa assim, tem mais
a ver com pais e directores a dar na cabeça dos professores para aumentarem as
notas e baixarem as expectativas do que com a aprendizagem real de matéria por
parte dos alunos.
Algumas pessoas parecem acreditar que na universidade se
dá uma espécie de transformação mágica. Que alunos aborrecidos por anos de
educação de segunda categoria vão desabrochar miraculosamente no espaço de
quatro anos. Eu sou professor universitário… Não vou dizer que isso nunca
acontece, mas é um pouco como enviar o seu filho para a universidade na
esperança de que aprenda a ser um jogador profissional de basquete. A maior
parte dos jogadores, mesmo os que são mesmo muito bons, nunca passam das
camadas universitárias e se não são verdadeiramente bons quando entram, é pouco
provável que consigam melhorar num ambiente de mata ou morre. Os alunos que
conseguem 12 no liceu raramente conseguem 20 na universidade.
Embora os defensores deste ponto de vista tendam a pensar
que é bom os alunos irem à missa e confessar-se, raramente acreditam que as
cadeiras de estudos religiosos valham muito tempo ou esforço. A substância da
teologia, séculos de esforço intelectual de alto nível e profunda reflexão,
conta para pouco, ao que parece. O que é mesmo importante é que o professor
dessas matérias vá aos jogos e aos teatros, que apoie e que mostre que a
teologia (Deus, a Igreja) se interessam.
Mas Deus livre esse mesmo professor de dar uma nota baixa
que ameace as perspectivas de um filho ou de uma filha entrar numa
“universidade de topo”. Não há fúria como a de um progenitor cujas esperanças
de uma bolsa são prejudicadas por uma nota baixa em… teologia. É como não
entrar em Harvard por causa de uma nota baixa em tricot. A indignidade! O
absurdo!
Um erro menos comum (e contrário ao primeiro, mas de uma
forma que o reforça) é cometido pelas pessoas que não querem saber da formação
intelectual dos alunos, desde que a escola os “conduza ao Céu”. Desde que haja
missa e confissões e o padre lhes pareça ortodoxo, tudo está bem. Raramente
perguntam se os alunos estão de facto a aprender alguma coisa, se alguém está a
conseguir ultrapassar as barreiras de cinismo adolescente e o barulho
ensurdecedor da cultura, se estão a aprender a viver como cristãos católicos
por desejo e desígnio, e não apenas por defeito. Se a escola se anuncia como
“ortodoxa”, então está tudo bem.
Nem uns nem outros parecem interessar-se particularmente
por uma educação distintivamente católica: a busca sistemática e profunda por
uma compreensão da fé que inspirou séculos de grandes mentes, desde Justino
Mártir a Agostinho, João Crisóstomo, Tomás de Aquino, Boaventura, Dante, Teresa
de Ávila, Newman, Pieper, Chesterton e o Papa São João Paulo Magno. Foi a fé na
unidade última da verdade que levou à criação, na Idade Média, dessa venerável
instituição, a universidade. Séculos das mais profundas reflexões sobre a
condição humana, na maior parte relegadas a prateleiras empoeiradas em troca de
abraços, equipas desportivas, ciência, tecnologia, engenharia e matemática e
mais uma assembleia sobre a ética sexual.
Claro que nenhuma destas coisas tem mal em si, mas quando
levamos com miúdos na universidade que lêem e escrevem ao nível de miúdos do
sexto ou do sétimo ano (não mais do que cinco páginas de leitura para trabalhos
de casa e não mais do que duas ou três frases interligadas numa redacção); que
sabem pouco mais sobre a sua religião do que o facto de que a Igreja Católica é
contra o aborto e o sexo antes do casamento; que não sabem o que é o
Pentecostes ou quem foram Abraão, Isaac e Jacob (isto é frequente); e que não
só nunca leram Dante, Chesterton ou Newman como não fazem a menor ideia quem
eles são, então desconfiamos que talvez alguém tenha as prioridades erradas.
O arcebispo Fulton Sheen foi uma das grandes luzes da
última geração. Ele tentou partilhar com os leigos fiéis a riqueza da tradição
intelectual católica, com discussões frequentes sobre Descartes, Pascal,
Agostinho, Tomás de Aquino e muitos outros, para poder instruir os simples
operários católicos e donas de casa que viam o seu programa de televisão.
Acreditava claramente que esta era a melhor forma de ajudar os católicos a
tornar a sua fé uma realidade viva por entre as complexidades do mundo moderno.
As pessoas que beneficiam de altos níveis de educação
secular e enfrentam os desafios de uma cultura social e política complexa
precisam de ter uma boa compreensão da sua fé. Caso contrário essa fé vai
parecer-lhes infantil e tornar-se letra morta, uma casca vazia. Catolicismo sem
convicção.
Quando é que as escolas católicas voltam a confiar, como o
arcebispo Fulton Sheen, na inteligência dos fiéis leigos, ao ponto de poder
deitar fora o lixo aborrecedor que actualmente traficam e dar aos jovens uma
formação a sério? Nem cem páginas de um manual de teologia moderno valerão
alguma vez uma única página das “Confissões” de Agostinho, da “Noite Escura da
Alma” de São João da Cruz ou do Evangelho de João.
Esta educação é a herança dos nossos filhos. Só um tolo a
trocaria por um prato de lentilhas.
Randall Smith é professor de teologia na Universidade de
St. Thomas, Houston.
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