David Carlin |
Por isso, vencida a Guerra, Roma arrasou Cartago e
dispersou a sua população. Alguns séculos mais tarde foi construída uma nova
cidade com o mesmo nome e foi nesta Cartago que Santo Agostinho viria mais
tarde a ser educado e tornar-se maniqueu. Mas a velha Cartago fenícia, de Dido
e de Aníbal, desapareceu para sempre. Nunca mais incomodou Roma.
Chegámos a este ponto na guerra entre a noção cristã da
sexualidade e a ideia secular moderna, o ponto em que o inimigo deve ser
destruído totalmente. A revolução sexual, que começou há cerca de 50 ou 60
anos, terminou numa vitória muito convincente para os revolucionários. A noção
cristã de conduta sexual foi derrotada. E agora os secularistas passaram ao
próximo passo, isto é, a destruição – a pulverização – da ideia cristã.
Os cristãos, derrotados, talvez quisessem dizer: “Tudo
bem, venceram a Guerra. Nós rendemo-nos e deixaremos de lutar pelo domínio. Mas
não podem ter misericórdia e tolerar-nos como uma minoria inofensiva, como se
toleram as pessoas que acreditam em discos voadores?” Mas os revolucionários
sexuais respondem: “Não, vocês e a vossa ética sexual incomodaram o mundo
durante demasiados séculos. Os vossos crimes são inumeráveis e imperdoáveis.
Temos de nos assegurar que a vossa ética não regressará para estragar novamente
os prazeres do mundo”.
Nas décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial a ética
sexual protestante continuava a dominar na América. O americano típico ainda
acreditava na maioria dos velhos tabus sexuais que prescreviam a fornicação, o
adultério, o aborto e a homossexualidade. Isso não significa que toda a gente
acatava essas proibições. Todas eram violadas, claro, de tempos a tempos. Mas
as pessoas não deixavam de acreditar nelas.
Havia falhas na ética protestante, claro. O
protestantismo clássico permitia o divórcio apenas por adultério, mas essa
limitação tinha sido abandonada há muito tempo. Nos anos 50 havia muitas causas
que legitimavam o divórcio e nos anos entre as guerras a contracepção dentro do
casamento tornava-se aceite entre protestantes americanos.
A ética católica era mais rigorosa. O catolicismo
acrescentava a proibição do divórcio e da contracepção. E mais, o catolicismo
exaltava a ideia do celibato, tornando-o obrigatório para padres, monges e
freiras.
Enquanto a maioria dos americanos, sendo protestantes, não
estavam dispostos a abraçar a ética católica, toleravam-na de bom grado e, até
certo ponto, admiravam-na, porque comprovava que os católicos, a maioria dos
quais eram recém-chegados aos Estados Unidos, não era tão maus como tinham sido
representados durante séculos pela propaganda religiosa anglo-americana.
Catão o Velho |
Levou mais algum tempo até que a homossexualidade se
tornasse aceitável, mas o dia chegou e só podia chegar, tendo em conta a
rejeição da antiga ética sexual cristã.
Tendo sido derrotada a ideia de sexualidade cristã,
começou agora a sua pulverização. A aceitação do casamento homossexual é mais
um passo nessa direcção. É a forma de os secularistas dizerem não só que a
homossexualidade é moralmente aceitável mas que é tão boa e nobre quanto a
sexualidade conjugal, que os cristãos consideram a mais perfeita.
A ideologia do transgénero é outro passo. É uma rejeição
da ideia bíblica de que “Deus os criou homem e mulher” (Marcos 10,6) – uma
ideia errada que era defendida por Jesus, um rabino bem-intencionado mas
preconceituoso do século I.
A poligamia, a poliandria, os casamentos abertos (adultério
consentido) – tudo isto ainda não foi aceite em larga escala. Mas será, uma vez
que a sua aceitação decorre logicamente do princípio fundador da revolução
sexual, nomeadamente a rejeição da ideia de sexualidade cristã. Tal como a
aceitação da homossexualidade não surgiu imediatamente nos anos 60 e 70 e a de
adultério também não, mas não se preocupem, está por pouco.
Mas o factor mais importante para a destruição total da
noção cristã de sexualidade não são as muitas práticas sexuais anticristãs que
existem no mundo de hoje. Também não é a aceitação alargada destas práticas
entre pessoas que, por uma razão ou por outra, preferem não participar delas.
Não, é a proibição – uma proibição social cada vez mais
eficiente que está cada vez mais perto de se tornar uma proibição legal – da
própria expressão de opiniões cristãs sobre sexualidade. Se for um cristão
antiquado que não se encontra do “lado certo da história” (para citar uma das
frases preferidas de Obama), que diz que a fornicação é um pecado, que o aborto
é homicídio, que a homossexualidade não é natural ou que a ideia de ser
transgénero é uma loucura – então será denunciado como um intolerante, um
misógino, um homófobo, um transófobo ou um mero idiota. Os seus juízos
negativos tornam-se “ódio” e estes ataques aos seus crimes de pensamento
aumentam de tom dia após dia.
O objectivo é que a moral sexual cristã, tal como
Cartago, se torne nada mais que uma memória.
David
Carlin é professor de sociologia e de filosofia na Community College of Rhode
Island e autor de The Decline
and Fall of the Catholic Church in America
(Publicado pela primeira vez na Sexta-feira, 22 de
Abril de 2016 em The Catholic Thing)
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