Infelizmente, compreendo perfeitamente porque é que o fez.
Antes de prosseguir, deixem-me dizer que embora eu não frequente com regularidade o rito antigo, já o fiz diversas vezes e fi-lo mesmo antes do Summorum Pontificum, mais do que uma vez. Conheço de perto várias pessoas para quem esta é a forma principal de missa.
Nada me choca no rito antigo e direi mesmo que uma das coisas que choca muitos, o facto de o padre estar virado para o altar durante grande parte da liturgia, eu gostava de ver aplicado ao rito novo também, pelo menos para algumas partes da celebração.
Não encontrarão aqui qualquer crítica ao rito que animou e alimentou os nossos avós e bisavós durante mais de um milénio.
Mas o rito não tem vida, é uma fórmula, um conjunto de instruções e rúbricas. No fundo, no fundo, quando não está a ser celebrado, o rito é um conjunto de palavras em folhas de papel. O problema não é o rito, portanto, é o que se faz com ele.
Tal como qualquer outro ritual, texto ou símbolo, a liturgia pode ser abusada e instrumentalizada. Acontece o mesmo com bandeiras. A bandeira dos confederados, nos EUA, não é apenas um pedaço de pano. Foi amada por muitos que morreram por ela e eram bons homens, mas hoje ganhou outro sentido, ao tornar-se o símbolo de saudosistas de sistemas racistas no sul dos Estados Unidos. A culpa não é de todos, mas de alguns. É fácil estragar um símbolo.
Infelizmente um certo sector de tradicionalistas radicais estragou o rito antigo. Estragou-o para todos nós que amamos a sua beleza, sem o transformar num instrumento ideológico. Porque é isso que os radicais de ideologias fazem. Estragam coisas.
O rito antigo foi liberalizado como um gesto de justiça para muitos e como um gesto de reconciliação para alguns que se encontram nas margens, ou mesmo fora da Igreja. O resultado, a nível global, não foi o desejável. As divisões acentuaram-se, muitos dos que estavam dentro ficaram cada vez mais fora e os que estavam fora não entraram.
Eu deixei de me sentir confortável nas celebrações do rito antigo quando me apercebi que se tinham tornado, em larga medida, locais de disseminação de ódio ao Papa Francisco e a muitos dos nossos bispos, onde se falava de uma igreja de iluminados e uma igreja de hereges ignorantes. Gosto de tradições e de solenidade, mas não o suficiente para me sujeitar a isso.
E foram estes que estragaram o rito antigo para o resto da Igreja. Vão fazer agora aquilo que fazem tão bem, vitimizar-se e lamentar-se de mais uma agressão por parte da Igreja Maçónica Globalista da Nova Ordem Mundial.
Pelo meio ficam – e escolho estas palavras com cuidado – vidas destroçadas, famílias divididas pela influência daquilo que se tornou em muitos casos uma verdadeira seita.
Não são todos, como é evidente. Alguns, talvez muitos, apenas lá iam por amor a uma tradição que não deixa de ser nossa só porque nascemos depois de ter sido reformada. São esses que ficam a perder. Neles me incluo. É pena.
Excelente analise. Revejo me em cada linha.
ReplyDeleteÉ mesmo!
ReplyDeleteNunca estive numa Missa com o rito antigo, não me "atraía", mas conheço quem, genuinamebte, se identificasse. Pena por todos esses que não aproveitavam um espaço sagrado para gerar guerras e estimular ódios dentro da Igreja.
ReplyDeleteCaminhemos!
Não sabe o que perde por causa de um preconceito. O mal que se aponta é a uma minoria que frequenta a Forma Extraordinária do Rito Romano. Há gente "normal" e fiel à Igreja que participa na Santa Missa nesta Forma. Alexandre
DeleteBoa noite.
ReplyDeletePor uma questão de justiça, e porque nos "mainstream media" a Paróquia de São Nicolau é sempre referenciada como a Igreja onde é celebrada a Missa antiga em Lisboa, quero deixar aqui claro que do púlpito dessa grande paróquia não se dissemina o "ódio ao Papa Francisco e a muitos dos nossos bispos", nem se fala "de uma igreja de iluminados e uma igreja de hereges ignorantes".
Nessa paróquia está-se em união com o Papa e com o Bispo de Lisboa.
Cumprimentos
Vasco
Obrigado, Vasco, pelo teu comentário. Que seja feita justiça.
DeleteEm todo o caso, só para ser claro, não sugeri que essas conversas viessem "do púlpito", isso também nunca vi.
De resto, tenho andado afastado mas tanto quanto sei - e espero estar certo - os grupos que tinham e têm esse tipo de conversa têm-se afastado de São Nicolau.
Cumprimentos,
Filipe
Bem !
ReplyDeleteOremos, para que tudo se faça, como Jesus quer.. E amemo_nos uns aos outros, com Deus nos ama. Difícil, mais Oração e menos conversa. Graças e Louvores se dêem a todo o momento, ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento.
ReplyDeleteQue bom seria se, igualmente, o Santo Padre manifestasse mais zelo em relação aos abusos litúrgicos na "Missa Nova", em particular, às inovações em relação ao que vem escrito no Missal de São Paulo VI, por parte, em particular, de jesuítas, dehonianos, salesianos e por aí vai,incluindo até padres diocesanos. Se é para arrasar com o mal das divisões na Igreja "pela raiz",que o faça também em relação aos mais progressistas.Até porque rezar as orações previstas no Missal sem deturpações, é um grande sinal de comunhão e unidade com a Igreja. Que o Papa não use dois pesos e duas medidas... Alexandre
ReplyDeleteObrigado, Filipe, pela lucidez honesta da tua análise
ReplyDeleteHá muitas pessoas que vão porque as ajuda, de facto, a sentir mais perto de Deus. Muitas ficarão, em breve, privadas de algo que lhes é caro e, para essas, não há uma palavra de compreensão. Parece quase proibido dizer que a Missa Tradicional pode ter algum valor espiritual, e tem-no. É grosseiro para com os fiéis, e não vou sequer entrar no desrespeito para com o Papa Bento XVI, nem para com os sacerdotes, publicando o MP a uma sexta com uma entrada em vigor imediata. Se isto é a atitude de um pastor...
ReplyDeleteEste pontificado tem sido uma desilusão, um exercício de arrogância, prepotência, vulgaridade, clericalismo, e autoritarismo rançoso que continua a surpreender, cada vez mais se assemelha a um projecto de poder pessoal.
Não vou muitas vezes, mas sei quando é que vou à Missa Tradicional: quando preciso de me re-concentrar na Eucaristia, o não ser inteiramente familiar ajuda, e para desenjoar do sentimentalismo diabético de muitas celebrações. Tudo más razões, claro, como seriam todas as outras que qualquer pessoa pudesse avançar... Sometimes, you can't win.
Fui pela primeira vez por pura curiosidade e, ao contrário do que esperava, não encontrei uma igreja vazia, nem velhos intelectuais obcecados com a pronúncia correcta do latim, mas sim uma igreja bem composta às 9h da manhã, uma comunidade igual a mil outras, com crianças choronas nos bancos como em mil outras, gente de todas as idades e, pelo menos nos Estados Unidos, de várias cores.
Tenho sinceramente pena do caminho que se está a trilhar e a responsabilidade não é só dos radtrad.
E não mandaria um adicional de bom senso, de paciência, de contenção, atenção pastoral e de diálogo antes da tomada desta decisão? Atendendo a uma incontável quantidade de argumentos contrários como seja em 1 lugar o facto de reverter uma outra tomada posição há menos de 14 anos (quanta impaciência! O que são 14 anos na história da Igreja ?) por um Papa ainda vivo e que primava pela contenção e pela fundamentação teológica, ficando o povo católico baralhado e a pensar ‘entendam-se e tenham calma’, depois o facto de lançar um anátema cruel sobre todos aqueles q estão mais próximos do rito antigo e a quem Bento XVI tinha acarinhado e criado expectativas e por fim a inevitável catalogação pela negativa o que é uma riqueza da Igreja.
ReplyDeleteTratando-se de uma 'coisa' boa não pode ser 'cancelada' à boleia de aspectos parasitários. Pela mesma lógica acabe-se com os escuteiros, sacristãos, organistas, padres bispos, grupos paroquiais até o Vaticano, porque não? veja-se a quantidade de prepotentes, amigos do alheio e predadores sexuais que também são atraídos para estas vidas! A analogia da bandeira da confederação apenas serve para demostrar como se pode machucar as coisas por aspectos laterais mas nunca para servir de exemplo neste caso, acho muito mais um exemplo tipico das tomadas de posição por oposição: para os esquerdistas o fado/Amalia eram maus porque fazia lembrar o salazarismo e para a direita qualquer cantor revolucionário era mau porque cheirava a comunismo.
Escuso de dizer se já fui ou não a missas tridentinas (pronto ok nunca fui) mas só esta justificação que todos dão ( do tipo eu até tenho amigos pretos ou até me dou com gays ....)já é um sintoma de que as pessoas estão anatematizadas e agora ainda mais divididas e com o sentimento de orfandade com origem precisamente naquele de quem esperariam paternidade. Será exegero? Ou não é verdade que foram catalogadas de rígidas e desequilibradas pelo seu Papa? Como se sentirão elas e os familiares dos seminaristas? São mesmo os únicos católicos de quem se pode ‘dizer mal’ e até exercer uma fina análise crítica dos seus comportamentos sem qualquer prejuízo de carácter ou perigo de ser acusado de estar a ser injusto ou de estar a julgar.
Fiquei mesmo com a sensação de que não imperou o bom senso e a paciência e com isso o bebé foi com a água da banheira e abriu-se uma caixa de pandora. Também achei que nesta época do 'cancel culture' o Papa tera perdido uma boa ocasião de respirar várias vezes antes de tomar esta decisão. Como disse nunca fui a uma missa Tridentina, onde de forma ignorante e maldosamente dizem que o padre está ‘de costas para o povo’ , mas vou frequentemente a algumas onde só a enorme esforço de concentração é possível elevar o espírito ora distraído pelo personalismo do celebrante, ora pela categoria do conjunto musical, ora por muitas outras coisas igualmente acessórias, parasitárias e secundárias e até sei de missas onde o padre põe músicas do Shrek durante a comunhão e outras originalidades. Também se tornou natural a escolha das missas pela qualidade do discurso do padre o que nada de mal oferece mas é tão só um sintoma da falta do principal sentido da missa e da dependência dos dotes do celebrante. O que ninguém pode negar é que numa fase de descontrolo e deserção dos católicos existindo excessos de parte a parte mandaria o bom senso muito mais contenção e pastoralidade no sentido de se ir chegando a um entendimento, analisar o que corre bem e mal e no mínimo tentar apaziguar.