David Warren |
O que este silêncio – ou muitas vezes murmúrio incoerente
– diz aos fiéis é que quando toca a testemunhar Cristo e os seus ensinamentos,
eles estão por sua conta. Podem ter o Catecismo para lhes recordar do que
consiste a fé, mas se tomarem posição sobre o assunto não podem esperar o apoio
dos seus líderes.
O mais provável, até, é que sejam discretamente
desacreditados como “fanáticos” e abandonados à sua sorte. Porque agora são
vistos como falando unicamente em nome próprio, numa altura em que tudo o que é
dito com clareza e precisão pode ser descartado como sendo o mero expelir de
“sentimentos” que depois são classificados como “incitamento ao ódio”.
Vivemos em tempos difíceis, em que regulamentos de
expressão avançam em todas as frentes: Académica, jurídica, social e política,
e a ditadura do relativismo se vai consolidando. Tudo o que se diz pode,
potencialmente, ser alvo de acção judicial pelo facto de poder, eventualmente,
ferir os sentimentos de membros desconhecidos de algum grupo politicamente
favorecido mas vagamente definido. O dissidente perde o seu ganha-pão, ou se
espera mantê-lo deve submeter-se à humilhação pública e a um qualquer curso de
“aconselhamento” ou de “treino de sensibilidade”, ou “reeducação”.
Eis que o maoismo está vivo e de boa saúde nas universidades,
e a espalhar-se. Ou, se o leitor preferir, o Estalinismo, ou o Hitlerismo. Ou
até o McCarthyismo, na medida em que também envolvia julgamentos de fachada.
O McCarthyismo foi derrotado bastante depressa – no
espaço de três meses – depois de várias figuras proeminentes do aparelho de
Estado terem confrontado o senador de Wisconsin, dizendo que estavam fartos. O
próprio McCarthy foi apelidado de parasita e o seu caso tornou-se um aviso para
quem o quisesse imitar.
Na verdade, um McCarthyismo mais formidável, de esquerda,
ganhou raízes no cadáver do político, cujo nome se tornou um slogan de
propaganda. Mas penso que no início houve genuína revolta para com a
irresponsabilidade das audições de McCarthy no Senado e foi preciso genuína
coragem por parte dos primeiros a tomar posição contra ele.
A mesma coragem que é necessária para todos aqueles – em
todos os tempos, de qualquer nação – que se opõem à injustiça.
Temos já, nesta altura, um legado de bispos corajosos e
dignos inscritos nos anais dos santos e dos mártires da Igreja Católica. Na
prática correspondem a um terceiro testamento, uma crónica exemplar de vinte
séculos em que, através das vidas de grandes homens e de grandes mulheres, a
vida de Cristo persistiu neste mundo.
O Leão de Münster |
Que são pouco frequentes deve-se ao facto de sermos
pecadores. Estamos de tal forma ligados aos nossos confortos mundanos, às
nossas imaginações mundanas, que mesmo diante da mais flagrante diferença entre
o bem e o mal acabamos por optar pela vida tranquila. E como se torna evidente
para quem lê os Evangelhos, o homem bem alimentado e com boa casa, com muitos
amigos e honras (tal como um bispo), tem mais a perder do que a maioria. Porquê
arriscar tudo em troca de perseguição pública e o risco de abandono por parte
dos seus próprios apoiantes? Por recompensas que não são deste mundo,
invisíveis salvo aos olhos da fé?
Ontem à noite fui ao lançamento de um excelente livro no
Oratório de Toronto. É escrito pelo padre Daniel Utrecht e é a melhor biografia
que temos actualmente em inglês do “Leão de Münster: O Bispo que Rugiu Contra os Nazis”. O seu nome era Clemens
August Conde von Galen e ainda há pouco tempo escreveu-se sobre ele uma crónica no The Catholic Thing. [E outra há ainda mais tempo, que pode ser lida aqui].
Ele fustigou o regime Nazi, especialmente as suas políticas
de extermínio (“eutanásia”), da forma como o deveriam ter feito todos os bispos
alemães entre 1933-45, embora a maioria tenha optado por um silêncio discreto,
ou na melhor das hipóteses uns murmúrios discretos.
Von Galen não esperou por autorização para falar, porque
ele tinha a autoridade. E isso era tão evidente para os seus fiéis na diocese
de Münster, e para católicos em toda a Alemanha, que os Nazis não se atreveram
a matá-lo, guardando esse acto delicioso até para depois de ganhar a guerra,
como confidenciou Hitler ao seu círculo mais próximo. Que esta não tenha sido
ganha deve-se, ao menos em parte, à coragem do bispo.
Gosto de imaginar como é que a história poderia ter sido
diferente. E se? E se todos os bispos se tivessem oposto ao regime da mesma
forma que von Galen? Então talvez o regime tivesse perseguido os católicos por
toda a Alemanha, repetindo o que fez a Kulturkampf de Bismarck, ou pior. Assim
teriam absorvido aquilo que os aliados fizeram quando finalmente derrubaram os
nazis e pelo caminho talvez tivessem resgatado para a Alemanha a sua herança
cristã esquecida.
Ou outro cenário. E se em vez de apenas um (São João Fisher),
todos os bispos britânicos se tivessem oposto a Henrique VIII? E se todos estivessem
dispostos a serem mártires, com todo o clero a seguir-lhes o exemplo, levando
os católicos a erguer-se por todo o país e não apenas em pequenas revoltas
isoladas? Não em violência, mas num acto de santa teimosia para dizer “Isto não
passará!”
No fundo, estas coisas são imponderáveis, mas gosto de
pensar nelas porque dão alguma ideia sobre o extraordinário poder que a Igreja
teria, fosse governada por leões.
David Warren é o ex-director da revista Idler e é
cronista no Ottowa Citizen. Tem uma larga experiência no próximo e extreme
oriente. O seu blog pessoal chama-se Essays in Idelness.
(Publicado pela primeira vez no Sábado, 26 de Novembro de
2016 em The Catholic Thing)
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