Austin Ruse |
Ao longo dos meus últimos artigos tenho estado a contar a
história das pequenas almas sofredoras:
A Audrey
Stevenson morreu de leucemia, aos 7 anos, depois de levar toda a sua
família à fé.
A Margaret
Leo morreu com 14 anos, após uma vida alegre de caridade cristã, apesar de
sofrer de espinha bífida.
O Brendan
Kelly morreu aos 15. Tinha trissomia 21 e viveu a vida toda com leucemia,
mas continua a inspirar todos os que o conheceram.
A primeira coisa que nos marca quando conhecemos estas
histórias é perceber o quanto sofreram. Estamos a falar de sofrimento intenso,
tanto físico como mental, de longa duração. Sofrimento atroz, do género de
fazer o soldado mais rijo chamar pela mãe.
Tanto a Audrey como o Brendan foram sujeitos a tratamentos
invasivos de quimioterapia, esteróides, punções lombares e, eventualmente,
transfusões de medula. Viveram longos períodos sem sistema imunitário, com o
perigo a espreitar por detrás de cada micróbio errante.
A Margaret Leo teve barras de titânio inseridas nas costas
para travar o curvar da coluna. Em vez disso foram as barras que entortaram.
Ainda hoje o seu pai guarda as barras tortas em cima da sua secretária, para
nunca se esquecer do que é, verdadeiramente, um dia mau.
Os pais da Audrey tinham de obrigá-la a falar da sua dor,
para que os médicos a pudessem ajudar. A Margaret raramente mencionava o seu
sofrimento e, no geral, sorria apesar de tudo e durante os períodos de pior
dor, o Brendan tentava fazer rir os seus pais, para que não se preocupassem com
ele. A maioria das crianças não é assim. Nós, adultos, não somos assim.
Enquanto seres humanos simplesmente não somos capazes de
imaginar este tipo de dor. Fugimos da dor. Escondemos a dor por detrás de
analgésicos cada vez mais desenvolvidos. Refugiamo-nos na cama. Choramingamos e
queixamo-nos. Falamos da nossa dor, talvez todos os dias. Um “Como é que isso
vai?” pode espoletar um verdadeiro catálogo até das dores mais pequenas. É
verdade que às vezes oferecemos a dor como sacrifício pelos outros, mas na
maioria das vezes não o fazemos.
O sofrimento é um dos grandes mistérios. Ocupa não só as
grandes mentes de todos os tempos, mas também o meu e o seu. Uma das Quatro
Nobres Verdades do Budismo é sobre o sofrimento e de como usar o Nobre Caminho
Octuplo para o evitar. O Hinduísmo vê o sofrimento como uma espécie de punição
por mau comportamento. O Islão diz que os fiéis devem aguentar o sofrimento
como uma prova da sua fé.
Só o Cristianismo vê o sofrimento como redentor, como uma
forma de partilhar no sofrimento de Cristo na Cruz e de Lhe diminuir o
sofrimento. Os católicos também acreditam que o sofrimento pode ser oferecido
para diminuir a dor dos outros. Esta noção é perfeitamente estranha à maioria
das religiões.
Uma leitora discordou veementemente de algumas das ideias no
artigo sobre a Audrey. Simplesmente não era capaz de conceber que a sua
história fosse verdadeira. Avisou que os adultos às vezes impõem as suas ideias
aos mais novos e perguntou se os pais da Audrey não teriam incutido nela uma
espécie de religiosidade precoce. A leitora, que é judia, questionou se às
vezes os adultos não vêem coisas nas crianças que de facto não estão lá. É uma
preocupação compreensível.
Uma vez dei uma entrevista sobre a Audrey a uma rádio
católica. A entrevistadora sugeriu que eu investigasse o caso de outra menina
com o mesmo nome, Audrey Santo, à volta da qual tinha crescido uma certa
devoção. Depois de um acidente de natação, esta menina desenvolveu uma condição
chamada mutismo acinético, que a deixou incapaz de se mexer e de falar. A sua
mãe levou-a a Medjugorje e anunciou que a rapariga, a pedido da Virgem Maria,
tinha aceite tornar-se uma alma vítima. Dizia-se que tinha as chagas, que as
imagens choravam, e por aí fora. O bispo local sugeriu cautela em relação a
toda a história.
Mas os casos sobre os quais escrevi não têm nada a ver com
isto. Não há estátuas a chorar, nem chagas. Só crianças normais em
circunstâncias extraordinárias. Eram antes de mais crianças, e não os objectos
de imaginações religiosas. Nenhuma delas queria estar doente ou sofrer.
O Brendan era a alma de todas as festas. Vi fotografias de ele
a dançar em casamentos com amigos e familiares a aplaudir. Adorava desporto. A
Audrey tinha de facto um sentido aguçado de propriedade e chegava a evitar ir a
festas de anos com medo de ouvir palavrões, mas não deixava de ser uma menina normal
que brincava com as irmãs e com as amigas. A Margaret adorava ver os outros
meninos a brincar no parque. Eram crianças normais a quem tinham sido dadas
grandes cruzes para carregar – e grandes dons para as ajudar a carregá-las.
São os santos do mundo actual. Mais do que isso, são santos
do nosso tempo, porque a outra coisa que noto sobre eles é que nasceram em
grandes desertos espirituais. Enquanto as suas famílias eram em larga medida
católicas praticantes, estas crianças cresceram num meio social de poder,
influência e riqueza, que tende a fugir de religião. São os verdadeiros
desertos dos tempos de riqueza.
O Brendan era amigo do James Pavitt, ex-chefe do serviço
clandestino da CIA. Erik Prince, o polémico fundador do serviço de segurança
privada Blackwater chorou como um bebé quando soube que Brendan tinha morrido,
e transportou toda a sua grande família do Médio Oriente para irem ao funeral.
A Audrey nasceu numa família influente em França, com
ligações e interesses nos Estados Unidos e noutros países.
A Margaret Leo tornou-se muito amiga de Clarence Thomas, o juiz
do Supremo Tribunal. A sua fotografia ainda está na sua secretária, dentro de
uma moldura feita por ela, de pauzinhos de gelado.
Quando pensamos em crianças a quem foram dados grandes dons
espirituais, normalmente pensamos em pastores, ou algo parecido, como em Fátima
e em Lourdes. Mas estas crianças eram diferentes. Estas receberam muitos bens
materiais, excelentes oportunidades de educação e conhecimentos sociais. Deus
colocou estas pequenas almas sofredoras nestes locais e neste tempo por uma boa
razão, para que as suas histórias possam tocar as almas que habitam as
casaronas de Great Falls, McLean, Paris e mais além.
Audrey Stevenson, Margaret Leo, Brendan Kelly, rogai por
nós.
Austin Ruse é presidente do Catholic Family & Human
Rights Institute (C-FAM), sedeado em Nova Iorque e em Washington D.C., uma
instituição de pesquisa que se concentra unicamente nas políticas sociais
internacionais. As opiniões aqui expressas são apenas as dele e não reflectem
necessariamente as políticas ou as posições da C-FAM.
(Publicado pela primeira vez na Quarta-feira, 3 de Julho
2013 em The
Catholic Thing)
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The Catholic Thing é um fórum de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade Religiosa com o consentimento de The Catholic Thing.
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