Wednesday 26 May 2021

#LoveWins, mas sem Alegria

Michele Malia McAloon
Há duas semanas, numa manhã chuvosa de segunda-feira, caminhei até uma pequena igreja Católica situada num beco na cidade de Mainz, na Alemanha. Mais de 100 igrejas católicas na Alemanha tinham anunciado serviços religiosos para os dias 9 e 10 de Maio, para abençoar casais de namorados, numa campanha publicitada na internet com o lema “love wins” [o amor vence].

Eu queria ver em que consistia esta “cerimónia de bênção” para todos os casais, independentemente da sua orientação sexual. Enquanto advogada de direito canónico que trabalha na área de processos de nulidade e de casamentos, estava interessada em ver que tipo de cerimónia seria esta, para pessoas que ou não estavam para se chatear com um casamento sacramental, ou então não compreendem que nem todas as proclamações de “amor” favorecem o florescimento humano.  

Esta iniciativa, que abrangeu toda a nação alemã, foi organizada por padres, diáconos e voluntários católicos que pensam, erradamente, que têm o direito e o dever de rejeitar a decisão de Março da Congregação para a Doutrina da Fé de que as uniões homossexuais não podem ser abençoadas. O site que promovia as cerimónias anunciava orgulhosamente: “Erguemos as nossas vozes e dizemos: Continuamos a colocar-nos ao lado daqueles que se comprometem numa relação vinculativa, e abençoamos as suas relações”.

Enquanto me instalava nas filas detrás da Igreja, rezei para que ninguém comparecesse. Esperava encontrar uma igreja vazia, e então iria alegremente jantar. Tanto quanto conseguia perceber, muito poucos casais tinham-se registado no site, como se pedia. E, de facto, só lá encontrei três casais – dois casais heterossexuais e um par de homens homossexuais.

No santuário, junto ao altar, estava um sacerdote e uma mulher vestida de diácono. Outro homem com um hábito castanho estava sentado, a tocar guitarra. O altar estava despido, à excepção de algumas velas. Ninguém se preocupou em levantar-se quando o padre entrou, nem em fazer o Sinal da Cruz. O “serviço” abriu com uma série de músicas folclóricas, cantadas pela mulher com a casula.

Toda a charada estava repleta de ironias, mas talvez a maior fosse o facto de estarmos a poucos metros de um famoso órgão pelo qual a pequena igreja, fundada em 1331 pelos antonitas e entregue às clarissas em 1620, é conhecida.

Durante todo o processo não houve a menor interação com a congregação. A mesma mulher aproximou-se do altar sem qualquer sinal de reverência exterior pela presença do Senhor no sacrário e fez uma homilia de 15 minutos sobre o amor. Depois dessa homilia, e de mais uma música, o padre fez uma leitura. Mais uma vez, ninguém se preocupou em levantar-se.

Depois, pediu aos casais que se levantassem e lessem algum tipo de declaração de amor um pelo outro. Não houve beijos para selar o acordo, nem qualquer sinal exterior de afeição. Toda a gente se sentou. A mulher cantou mais um bocado e em menos de 30 minutos tudo tinha acabado.

O padre aproximou-se de mim no final e, para dizer a verdade, só me consegui afastar. Não há palavras em inglês ou em alemão que pudessem justificar um tal gesto cismático por parte de qualquer pessoa na Igreja.  

São Bonifácio
Não me preocupei com o jantar, já não tinha apetite. Tudo aquilo tinha sido deprimente e triste. Não houve qualquer sentido de celebração, só o sentido duramente mundano de uma tarefa cumprida, algo mais parecido com o registo de um automóvel na Direção-geral de Viação do que a natureza alegre de um baptismo ou de um casamento.


Não houve trajes nupciais. Os casais estavam vestidos de calças de ganga e camisolas. Tudo se passou sem champagne, bolo, jantar, amigos e família juntos para celebrar o começo de uma comunidade de vida e de amor.

A terra de Martinho Lutero continua sujeita a fortes restrições por causa da Covid-19, por isso não havia restaurantes abertos para celebrar aquilo que tinha acontecido. Será que os casais voltaram para casa e festejaram com um jantar de restos e de Netflix? Terá esta bênção transmitido magicamente a ideia de que um compromisso para a vida toda tem de facto a ver com o trabalho duro e nada romântico de salvação e redenção, enquanto esposos que dão a vida um ao outro com o objetivo de levarem-se um ao outro até ao Céu?

Ou será que tudo não passou de uma farsa politica/ideológica?

Em vez da concessão de graça dada pelo Espírito Santo por via de um verdadeiro sacramento, os casais que alegadamente procuravam a riqueza dos tesouros da Igreja receberam migalhas sacramentais das mãos dos padres que deviam ser os primeiros a saber a diferença entre verdadeira empatia e falsa “compaixão”.

No final de contas, nada saiu de tudo isto para além da manipulação de pessoas para fazer uma espécie de afirmação política sobre casamento homossexual e um manguito adolescente para o Vaticano.

Enquanto regressava ao meu carro, passei por uma estátua de tamanho real de São Bonifácio, bispo e mártir (680-754 AD) que está diante da Catedral de Mainz. Durante a sua vida este santo anglo-saxónico tornou-se conhecido como o Apóstolo do povo germânico, depois de ter derrubado com um machado uma árvore sagrada, adorada pelos pagãos germânicos.

De acordo com a lenda, São Bonifácio usou a madeira da árvore para construir uma igreja dedicada a São Pedro. Quando se tornou arcebispo de Mainz, em 752, recebeu como pálio um pano que tinha sido colocado sobre o túmulo de São Pedro.

São Bonifácio foi martirizado por causa da sua fidelidade aos ensinamentos da Igreja, destemido apesar das muitas ameaças feitas por adoradores de falsos deuses. Quem diria que a sua vida santa seria, depois de séculos de Cristianismo na Alemanha, um comentário irónico sobre aqueles que preferem o cisma à unidade, o individualismo indulgente à comunidade e a destruição social à graça vivificante?

São Bonifácio, rogai pela Alemanha – e por nós.


Michele Malia McAloon é casada há quase 28 anos. É mãe, oficial das Forças Armadas americanas na reserva e advogada de direito canónico. Vive em Wiesbaden, na Alemanha. Pode ouvir o seu podcast “Cross Word” no Spotify, Apple Podcasts e archangelradio.com.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no sábado, 20 de Maio de 2021)

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