Pe. Jerry J. Pokorsky
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No Evangelho Jesus promete: “Vim para que tenham vida e
para que a tenham em abundância” (João: 10,10). Trata-se da garantia mais
sublime e consoladora deste lado da eternidade.
Quando tudo corre bem e estamos a experimentar as bênçãos
da felicidade e da boa sorte, aceitamos facilmente este ensinamento. Quando
conjugada com a saúde e com uma família normal e feliz e uma situação
profissional razoavelmente segura, a prática sincera da fé traz um sentido
autêntico de gratidão que nos incentiva a maior devoção e generosidade.
Mas quando nos deparamos com dificuldades familiares ou
maritais, insegurança laboral ou problemas de saúde crónicos, podemo-nos sentir
tentados a duvidar desta promessa de Cristo. Como é que se pode viver uma vida
de abundância em Cristo enquanto experimentamos grande tristeza ou privação? A
maior parte de nós seria tentada a perder a fé e a pensar que a promessa de
“vida em abundância” não passa de uma piada cruel. Precisamos de uma resposta
inteligível.
Quando Saulo caiu por terra na estrada para Damasco, ouviu
a voz de Jesus: “Saulo, Saulo, porque me persegues?” (Actos: 9,4). Jesus reina na
glória celeste, porém esta narrativa revela claramente que o próprio Jesus
sofre quando os cristãos são perseguidos. São Paulo desenvolverá este
ensinamento, deixando claro que Jesus não é um senhorio ausente. “Porque todos
quantos fostes baptizados em Cristo já vos revestistes de Cristo.” (Gal. 3,27). Cristo continua a viver entre nós
na Sua Igreja. O Seu Corpo Místico.
São Pedro empurra-nos no sentido de reconciliar o
sofrimento com uma vida abundante em Cristo. Em Cristo o sofrimento é elevado
pela graça e ganha um novo sentido: “Se vocês suportam o sofrimento por terem
feito o bem, isso é louvável diante de Deus. Para isso vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu
no vosso lugar de vocês, deixando-lhes exemplo, para que sigam os seus passos.”
1 Pedro 2: 20-21
Logo, o sofrimento dos membros do Corpo Místico de Cristo
partilha do seu sofrimento redentor. Isto ajuda-nos a compreender a afirmação bastante
surpreendente de São Paulo de que ele agora alegra-se nos seus sofrimentos:
“Regozijo-me agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das
aflições de Cristo, pelo seu corpo, que é a Igreja”. (Col. 1:24)
Quando sofremos, Cristo sofre connosco no seu Corpo
Místico, e o nosso sofrimento participa no sentido que lhe foi dado por Cristo
na Cruz. O nosso sofrimento em Cristo dá continuidade, de forma misteriosa, à
obra da redenção.
O Pai não é um superintendente cruel. No livro da Sabedoria
lemos: “Deus não é o autor da morte, a perdição dos vivos não lhe dá alegria
alguma” (Sab. 1,13). Considerem a angústia de Abraão no Livro de Genesis quando
leva o seu filho Isaac até à montanha para o sacrificar. Quando o anjo do
Senhor segura a mão de Abraão, o Senhor revela que não se alegra a sua
angústia, alegra-se com a sua obediência. Porém, a angústia de Abraão valida e
magnifica a força da sua obediência na fé.
Isaac, como é evidente, representa a figura de Cristo o
Filho e Abrãao é a figura do Pai. Por isso é razoável concluir que o Pai não se
alegra no sofrimento redentor do seu Filho na Cruz, nem se alegra com o nosso
sofrimento. O Pai “alegra-se” com a obediência do seu Filho, uma obediência que
o sofrimento e a morte em nada diminuem. A coragem e o sofrimento de Cristo
testemunham a suprema excelência da sua obediência ao Pai.
A excelência da sua obediência é aumentada pela sua
liberdade. Durante a sua prova Ele diz a Pilates: “Acha que eu não posso pedir
a meu Pai, e ele não colocaria imediatamente à minha disposição mais de doze
legiões de anjos?” (Mt. 26,53). Jesus revela logo porque é que aceitou essa
pena de morte: “Como, pois, se cumpririam as Escrituras, que dizem que assim
convém que aconteça?” (Mt. 26,54). As escrituras cumprem-se quando Jesus aceita
voluntariamente a sua morte em obediência pela nossa redenção e salvação.
Sofrimento pode ter sentido |
Mas o amor de Cristo e a vida na sua graça podem
perder-se, por isso Jesus ensina: “Se guardares os meus mandamentos
permanecerão no meu amor, tal como eu guardei os mandamentos do meu Pai e
permaneço no seu amor” (Jo. 15,10). A obediência e o sofrimento que
frequentemente os acompanham demonstram que a coragem, a convicção e uma
consciência tranquila sustentam a alegria da vida com Cristo: “Digo-vos isto
para que a minha alegria esteja em vós e que a vossa alegria seja completa”
(Jo. 15,11).
O mandamento mais significativo de todos é dado na Última
Ceia: “E, tomando o pão, e havendo dado graças, partiu-o, e deu-lho, dizendo:
Isto é o meu corpo, que por vós é dado; fazei isto em memória de mim” (Lc.
22,19). A nossa obediência na Graça de Deus é premiada com o Verbo a fazer-se
Carne novamente, na Eucaristia: A Santa Comunhão, a fonte e o ápice da vida
cristã.
A “vida em abundância” do Senhor purifica e eleva todas
as alegrias e as tristezas terrenas. É uma vida de coragem, de convicção, de
consciência tranquila e de comunhão com Ele, com a nossa própria carne
santificada pelo seu santíssimo Corpo e Sangue. Nunca é demasiado tarde para
viver a sua Vida em abundância com esperança firme e verdadeira alegria.
O padre Jerry J. Pokorsky é sacerdote na diocese de
Arlington e pároco da Igreja de Saint Michael the Archangel em Annandale,
Virgínia.
(Publicado pela primeira vez no domingo, 28 de Maio de
2017 em The Catholic Thing)
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Saúl ou Saulo?
ReplyDeleteCorrigido! Obrigado.
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