Esther Mucznik |
Transcrição completa da curta entrevista que fiz a Esther Mucznik, da Comunidade Israelita de Lisboa, a propósito da visita do Papa Francisco à Sinagoga de Roma. A reportagem pode ser lida aqui.
Esta visita do
Papa à sinagoga de Roma no domingo, o que representa para a comunidade judaica?
É uma visita simbólica, em primeiro lugar, porque os
últimos dois Papas, um dos primeiros gestos que fizeram sempre foi visitar a
Sinagoga de Roma, que é de facto uma sinagoga simbólica nesse aspecto. Portanto
penso que é mais um passo que este Papa dá, no sentido de uma aproximação e de
uma convivência muito boa com o Judaísmo, que aliás ele tem mostrado mesmo
antes de ser Papa, aliás ele tinha uma óptima relação na Argentina com o rabino
Abraham Skorka e eu penso que esta visita é um gesto muito importante.
É sempre um gesto simbólico. A visita do Papa à sinagoga
de Roma é sempre um gesto simbólico. Ainda o outro dia estava a ver um
documento do Vaticano, no âmbito da comemoração da encíclica Nostra Aetate, e o
documento diz coisas que são profundamente significativas para nós judeus.
Tenho aqui até uma frase: "Que é preciso aprofundar o diálogo teológico, o
diálogo com o judaísmo, e que este tem um carácter inteiramente diferente e se
situa a um nível inteiramente diferente das outras religiões. Que a fé dos
judeus, atestada na Bíblia, não é para os cristãos uma outra religião, mas o
fundamento da sua própria fé." E continua dizendo que com o judaísmo se
fala sobretudo de um diálogo intra-religioso, achei isto muito curioso, não
inter-religioso, mas intra-religioso ou intra-familial.
Parece, por isso, que o Papa situa o Judaísmo o diálogo
com o judaísmo num âmbito completamente diferente. Aliás ele disse logo desde o
início que os judeus são os "irmãos mais velhos" dos cristãos. E
portanto acho que tem havido uma série de gestos deste Papa, que remontam ao
período em que ele ainda não era Papa, que coloca as relações com o judaísmo
num nível especial, e penso que para o judaísmo, para nós judeus, é
extremamente importante, porque quando pensamos nos dois mil anos de ausência
de diálogo, para não dizer mais, no quanto foi trágico para os judeus, penso
que se deve valorizar muitíssimo esta nova situação, a partir de 1965,
evidentemente, mas que se tem vindo a cimentar e, nomeadamente com o Papa
Francisco, e com os outros dois também, sobretudo, mas nomeadamente com o Papa
Francisco se tem vindo a desenvolver e cimentar de uma forma muito especial.
Falava dessa
história trágica, que todos conhecemos, nomeadamente no que diz respeito à Shoah,
ou ao Holocausto, como costumamos dizer, sendo obviamente um episódio terrível
da história, acabou se calhar por servir de pivot para esta nova relação entre
cristãos e judeus, nomeadamente entre a Igreja Católica e os judeus, ou não?
Essa sempre foi a minha convicção. Acho que a dimensão,
as características da tragédia do holocausto, acho que muito provavelmente
provocaram um abalo nas consciências em geral, mas nomeadamente também na
consciência da Cristandade. Penso que isso de facto teve um papel importante.
Aliás, acho que há um documento do Vaticano que se chama “Nós
Recordamos” que, embora não fazendo uma ligação automática, evidentemente –
nem tinha que fazer – entre as perseguições ao longo de dois mil anos de anti
judaísmo cristão, essencialmente, aponta o facto de isto ter podido contribuir
para o que aconteceu.
Acho que há de facto um reconhecimento que esses dois
milénios de perseguições de facto contribuíram para criar uma mentalidade que
de certa maneira considerasse de alguma normalidade a perseguição aos judeus,
que tomou obviamente com o Nazismo uma forma diferente, totalmente diferente,
com características diferentes, mas que tinham esse fundo de anti-judaísmo que
existiu ao longo dos séculos.
Para esta reportagem foi também entrevistado o padre Peter Stilwell, especialista em diálogo inter-religioso e ecuménico.
Para esta reportagem foi também entrevistado o padre Peter Stilwell, especialista em diálogo inter-religioso e ecuménico.
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