James V. Schall sj |
Quando o Papa Bento XVI entrou na Catedral de Westminster
para celebrar missa durante a sua visita a Inglaterra em 2010, fê-lo ao som de
“Tu est Petrus”, composto pelo compositor escocês Sir James MacMillan. Como
comprovam as ruínas de inúmeras catedrais, a Escócia foi em tempos um país
católico. Alguns dos clãs ainda são. Nas palavras de Samuel Johnson, no seu
“Diário de uma Viagem às Hébridas”, “Não é de invejar o homem cujo patriotismo
não ganhe força na planície de Maratona ou cuja piedade não se acalente entre
as ruínas de Iona”.
MacMillan foi escolhido como “Católico do Ano, 2015” pelo “Catholic Herald” e é um admirador confesso de Bento
XVI, que também coloca a música e a beleza no cerne da vida humana. “A beleza é
o coração da nossa fé cristã”, escreve o compositor. “Deve estar no centro das
nossas atenções quando nos aproximamos, em adoração, do trono de toda a Beleza”.
Há muito que a Igreja percebe que os homens precisam tanto de beleza como de
pão para a boca, a longo prazo, talvez precisem mais.
No “Relatório Ratzinger” (1985) lemos: “O Cristianismo não
é uma especulação filosófica; não é uma construção da nossa mente. O Cristianismo
não é obra ‘nossa’; é uma Revelação; é uma mensagem que nos foi confiada e não
temos o direito de a reconstruir ao nosso gosto ou à nossa escolha.”
Os papas e bispos não têm missão mais importante do que
manter essa “mensagem” essencial intacta. A “especulação filosófica” surge
apenas no seguimento, e como auxílio, da recepção adequada da revelação e do
seu conteúdo. Qualquer tentativa de “reconstruí-la” ou diluí-la à luz de uma
imaginada “construção” da mente é em si a recusa daquilo que nos foi confiado.
É isso que Deus quis que estivesse presente no mundo ao longo dos tempos e
entregou à Igreja com esse objectivo, por mais impopular ou estranho que seja
numa dada cultura ou era.
O Sir James MacMillan colocou a questão desta forma.
“Muitas pessoas, crentes ou não, dedicaram toda a vida a tentar diluir o
Cristianismo, vendo num secularismo uniforme e cinzento um inevitável passo
seguinte. É verdade que vivemos numa sociedade plural, mas a nossa civilização
foi moldada por uma cultura e valores judaico-cristãos. Alguns de nós
continuaremos a celebrar isto e a viver a nossa fé como pluralistas”. Não há
que duvidar que muito do Protestantismo e do Catolicismo liberal moderno tem-se
dedicado de facto a “diluir” os princípios básicos da revelação e da realidade
a que se referem.
Sir James MacMillan |
O tipo de “pluralismo” seguido por MacMillan é mais
robusto do que o “multiculturalismo” que actualmente nos rege. O
“multiculturalismo” moderno, do estilo que MacMillan rejeita, baseia-se no
cepticismo. Por princípio, nada é verdade. Todas as ideias religiosas são
igualmente erradas. Ninguém pode reclamar conhecer a verdade.
No “pluralismo” de Sir James MacMillan, os pensamentos e
as ideias diferentes não são algo que se deve esconder, mas que se devem viver
de forma aberta e legal. Frequentemente é preciso grande coragem para o fazer.
A ideia de que a paz se alcança através da remoção
forçada de qualquer símbolo religioso estabelece, de facto, o “humanismo
secular” como “confissão pública” obrigatória, tudo em nome de
“multiculturalismo”. É um conceito que, pelo que se vê, se revelou tão estreito
e letal como qualquer religião do passado. Baseia-se, novamente, na afirmação
de que não existe verdade.
Tal como Bento XVI, Sir James compreende que o seu
pluralismo tem por base a razão. Não nega a existência de fanatismo nalgumas religiões,
que deve ser enfrentado de forma directa, mas ao mesmo tempo afirma que aquilo
que foi revelado é para ser conhecido e vivido. Estas são as verdades que ele
continuará a celebrar e defender dentro das nações, a começar pela sua própria.
Por fim, repito, com Joseph Ratzinger que “o Cristianismo
não é obra ‘nossa’; é uma Revelação”, e com Sir James: “A beleza é o coração da
nossa fé cristã”.
“Tu est Petrus” de James
MacMillan.
James V. Schall, S.J., foi professor na Universidade de
Georgetown durante mais de 35 anos e é um dos autores católicos mais prolíficos
da América. O seus mais
recentes livros são The Mind That
Is Catholic, The Modern Age, Political
Philosophy and Revelation: A Catholic Reading, e Reasonable
Pleasures
(Publicado pela primeira vez na Terça-feira, 5 de Janeiro
de 2015 em The Catholic Thing)
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