Wednesday, 7 June 2017

A Outra Europa

A semana passada, enquanto o líder do mundo livre estava ocupado a destruir o sistema americano de alianças cuidadosamente construído ou a abalar a estrutura política nacional e estrangeira para poder lidar com os desafios ambientais, dependendo dos órgãos de comunicação que vêem, aconteceu algo igualmente importante – e mais fundamental – na Hungria, que passou quase despercebido.

Fui convidado para falar no 11º Congresso Mundial para as Famílias, que decorreu em Budapeste. Mas é difícil exprimir o quão inspirador e esperançoso – e inesperado – foi o evento.

Estamos tão afundados nas nossas obsessões políticas que quase nunca ouvimos falar disso, mas há milhares de activistas e organizações de defesa da família e do casamento a trabalhar à volta do mundo. A maioria esteve presente em Budapeste a semana passada. E mais importante que tudo, fora da Europa Ocidental, da América do Norte e de países culturalmente parecidos como a Austrália e a Nova Zelândia, os países não estão de todo a seguir as modas absurdas e suicidas sobre casamento e filhos que acreditamos, falsamente, terem dominado o mundo.

A Hungria é um exemplo na própria Europa. O primeiro-ministro, o ex-dissidente soviético Viktor Orban, conseguiu inverter a tendência desastrosa de casamento e nascimentos que a Hungria, à imagem da Europa ocidental, revelava há anos. É o resultado tanto de compromissos sociais como de políticas específicas.

A Constituição da Hungria de 2011, a primeira adoptada desde que recuperou a liberdade depois da queda da União Soviética, diz o seguinte:

Artigo L (1) A Hungria protegerá a instituição do casamento enquanto união entre um homem e uma mulher, estabelecida voluntariamente, e a família como base da sobrevivência da nação. Os laços familiares basear-se-ão no casamento e/ou na relação entre progenitores e filhos. (2) A Hungria encorajará o compromisso de ter filhos.

Pode parecer um gesto vazio de sentido, tendo em conta a cultura dominante entre as elites internacionais, mas há dez anos a Hungria tinha um índice de casamento de 3,6 por mil, o mesmo que países do Sul da Europa como Itália, Espanha e Portugal. Agora está perto dos 4.75 e continua a subir.

De igual forma o índice de fertilidade na Hungria passou do mesmo que a Europa Ocidental para cerca de 1,45 – e parece estar a subir em direcção aos mágicos 2,1 necessários para garantir a estabilidade demográfica. Estas mudanças levam tempo e o Governo da Hungria reconhece que não haverá estabilidade demográfica até cerca de 2030. Entretanto foram inseridas no sistema húngaro uma série de vantagens para as famílias por forma a encorajar não só o casamento e a procriação, mas famílias com três filhos ou mais.

A recuperação de atitudes saudáveis a respeito do casamento e da família não é uma impossibilidade quando a sociedade reconhece que ambos são importantes para o bem-estar humano e para a estabilidade social, e desde que os governos nacionais não empreendam uma cruzada para os destruir.

Na verdade, a resistência da Hungria aos esforços da União Europeia para expandir o “casamento” gay tem citado a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais: “O direito de contrair casamento e o direito de constituir família são garantidos pelas legislações nacionais que regem o respectivo exercício.” As relações jurídicas são sempre complexas, claro, mas a Carta Europeia, como a Constituição americana, não dá ao Governo central qualquer jurisdição sobre o casamento e a família.

E não é só a Hungria. A Eslováquia emendou a sua constituição em 2014 e definiu o casamento da mesma forma que a Hungria. E isso foi sob um Governo socialista. Na Polónia o artigo 18º da Constituição diz: “O casamento, sendo uma união entre um homem e uma mulher, bem como a família, maternidade e paternidade, serão colocadas sob a protecção da República da Polónia”. A Roménia está a seguir o mesmo caminho.

Claro, estas não são as grandes potências da Europa. A Alemanha, França e Reino Unido – e sobretudo a distante América – são quem define, em larga medida, a agenda da comunidade internacional. Pelo menos é isso que os radicais querem que se pense sobre os poderes das Nações Unidas e outras organizações como a Organização Mundial de Saúde.

Mas vejam isto:




As áreas azuis escuras são os lugares onde o “casamento” gay é legal. Mas os países encarnados são aqueles onde é ilegal – sendo o casamento definido como sendo entre um homem e uma mulher. As áreas azuis estão no meio, tanto geográfica como juridicamente: permitem algumas formas de união “não-tradicional”, mas não as equacionam ao casamento.

De certa forma até na Europa existe divisão entre estados azuis e encarnados. Apesar de todas as acusações de que o casamento, a família, a moral sexual etc. têm sido feitos reféns por “progressistas”, isto é, radicais que não sabem bem com o que é que se meteram, mesmo na Europa decadente e em colapso demográfico existe resistência significativa.

Não deve ser por acaso que é precisamente nas periferias europeias, as partes que até há pouco estavam sob domínio comunista, que a resistência é mais forte. Elas ainda se lembram dos antigos totalitarismos e não se deixam intimidar pelos novos.

Mais, têm a vantagem de poder ver – tanto na América como na Europa ocidental – onde é que a nova ética totalitária conduz: A uma perda de fibra social e uma perda, literal, daquilo que forma uma sociedade – pais com filhos.

Claro que, por terem enfrentado esta crise de frente e por se terem recusado a aceitar refugiados muçulmanos para colmatar as falhas demográficas, têm sido acusados de esmagar os direitos dos homossexuais e de estarem a encorajar uma nova forma de nacionalismo perigoso, com tons fascistas.

Viktor Orban é pai de cinco filhos. Muitos dos seus ministros e secretários de Estado são pessoas novas com famílias grandes. E no resto da Europa central e sudeste as principais figuras políticas têm filhos, ao contrário dos líderes da União Europeia, da Alemanha, de França, Itália e Reino Unido.

Os opinadores progressistas pensam que estão “do lado certo da história”. Mas é difícil dizer o que será precisamente o futuro progressista, uma vez que não parece preocupar-se com o futuro literal de crianças e sociedades suficientemente férteis para se reproduzirem.

Do nosso ponto de vista essa forma de encarar o mundo é que passou à história, no sentido de que já pertence ao passado e não tem futuro a longo prazo. Outros modelos, mais esperançosos mas que dão menos nas vistas, estão a surgir numa variedade de lugares inesperados.


Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press. The God That Did Not Fail: How Religion Built and Sustains the West está também disponível pela Encounter Books.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na quinta-feira, 1 de Junho de 2017)

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