Bevil Bramwell, OMI |
Com a chegada do ano novo, pode ser útil recordar-nos
daquilo com o qual estamos comprometidos. Como sabemos, Jesus denominou-se “o
Caminho, a Verdade e a Vida”, e disse ainda, “Ninguém chega ao Pai senão por
mim” (João 14,6). Por isso a sua pessoa é o Caminho.
Quando os primeiros cristãos eram perseguidos,
os seus algozes procuravam “homens e mulheres que pertencessem ao caminho”,
(Actos 9,2). O Papa emérito Bento XVI desenvolveu a questão do Catolicismo
enquanto um caminho e não uma religião, no sentido de que não pode ser reduzido
a uma mera listagem de coisas a cumprir.
O Catolicismo é, antes, a forma de vida completa
e total, encorporada em Cristo – aquele que vive cada dia em cumprimento da
vontade do Pai. Em contraste, numa religião os nossos deveres para com Deus
ficam cumpridos. A religião permite ter tempo livre da religião! Ficamos com
tempo para actividades seculares – como se alguma coisa fosse verdadeiramente
secular.
As pessoas que se deixam envolver com “religiões”
normalmente acabam por ter mais que uma. Pode passar por um recurso ao
Cristianismo em situações de emergência; obsessão por compras; fascínio por
sexo; fixação por um clube; dependência de um meio social; preocupação com o
sucesso dos negócios. Sendo uma pessoa religiosa, neste sentido, significa
passar a vida a saltitar de uma religião para outra.
Mas estar no caminho, por sua vez, significa
sujeitar-se de forma humilde às situações, porque elas vêm de Deus. Daí
compreendemos que: “Um samaritano, porém, que também estava a viajar por aquele
mesmo caminho, teve pena do homem quando o viu. Chegou perto dele e fez
curativos para as suas feridas, colocando nelas azeite e vinho. Depois disso, colocou
o homem no seu jumento e levou-o para uma hospedaria e cuidou dele.” Este é o
dom desinteressado de si ao outro, por amor. Este é o coração do caminho.
Pela mesma lógica, um casamento pode ser “religioso”
ou pode ser um casamento do caminho. Num casamento “religioso”, neste sentido
de que falamos aqui, há uma série de deveres que compõem o “casamento” e quando
estes estiverem cumpridos então já não há nada por fazer. Claro que se isso não
me deixar satisfeito então tenho a opção do divórcio, porque da minha parte já
fiz tudo o que se esperava. Repare-se como esta lógica está centrada no “eu”.
Este “casamento” é uma construção minha e não uma realidade de Deus. O “casamento”
é o meu projecto e está fechado ao outro e a Deus.
Tertuliano |
A vida no caminho para Deus não tem quaisquer
limites imaginados e auto-impostos. Estamos a caminho da infinidade de Deus e
por isso não podemos sequer começar a imaginar o que significa amar-nos, ou o
quanto eu e a minha mulher conseguiremos amar. Tentar fazê-lo é impor limites a
Deus e contentar-nos com a ideologia mundana do momento.
Estando casado pelo caminho, encontro-me
aberto a tornar-me mais do que alguma vez conseguiria imaginar. Enquanto marido
e mulher, descobrimos o sentido da vida à medida que caminhamos. Quando o amor
chega a este ponto, torna-se mesmo um amor desinteressado. É por isso que o
casamento é para toda a vida. É por isso que o casamento é salvífico – ajudamo-nos
um ao outro e aos nossos filhos, a caminho de Deus.
Ouçamos o que Tertuliano tem a dizer sobre
este tipo de casamento:
Ambos
são filhos do mesmo Pai, servos do mesmo Senhor, formando uma só carne, um
só espírito. Oram juntos, adoram juntos, jejuam juntos, ensinam-se um ao
outro, encorajam-se um ao outro, apoiam-se um ao outro.
Encontramo-los
juntos na igreja, juntos no banquete divino. Partilham por igual a pobreza
e a abundância, as perseguições e as consolações. Não há segredos entre
eles, nenhuma falsidade: confiança inviolável, solicitude recíproca,
nenhum motivo de tristeza. Não têm de se esconder um do outro para visitar
os doentes, para dar assistência aos indigentes; a sua esmola não é motivo
de disputa, os seus sacrifícios não conhecem escrúpulos, a observância dos
seus deveres quotidianos é sem entraves.
Entre
eles não há sinais da cruz furtivos, nem saudações inquietas, nem acções de
graças mudas. Da sua boca, livre como o seu coração, elevam-se hinos e
cânticos; a sua única rivalidade é a de ver quem celebra melhor os
louvores do Senhor. Cristo alegra-Se com tal união; a tais esposos Ele
envia a sua paz.
Isto é o casamento no caminho do Senhor!
Bevil Brawwell é sacerdote dos Oblatos de
Maria Imaculada e professor de Teologia na Catholic Distance University.
Recebeu um doutoramento de Boston College e trabalha no campo da Eclesiologia.
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