Thursday 17 July 2014

Um Poder Superior

Randall Smith
Uma amiga explicou-me recentemente, e de forma irritadiça, que deixou de acreditar na existência de um “poder superior”. Ainda bem. Como os mitos gregos nos mostram, os “poderes superiores” são capazes de todo o género de coisas que não são particularmente simpáticas para os humanos. E, para dizer a verdade, o conceito de um “poder superior” é demasiado fraco para perdurar muito tempo.

Por isso, quando as pessoas rejeitam a noção de um “poder superior”, na maioria das vezes estão a abandonar as suas ideias pagãs de Deus como um Grande Mestre de Xadrez do Universo, que move as suas criaturas como peões no grande tabuleiro do cosmos.

Ou então têm pensado no “poder superior” como se fosse “a força” da Guerra das Estrelas. O problema com “a Força”, como a Guerra das Estrelas nos mostrou, é que os maus a podem usar tão eficientemente, senão mais, que os bons. Quanto ao “equilíbrio” na Força, bem, tanto quanto consigo perceber, significa pouco mais que guerra constante – e mais filmes. Se a “Força” existisse mesmo, e se dependesse da existência de bichos que vivem dentro de nós, eu inventaria uma vacina para a curar. Personagens que conseguem estrangular outras com o poder da mente merecem ser curadas, não admiradas.

Os cristãos não acreditam simplesmente num “poder superior”. Acreditam num Deus de Amor Altruísta e Abnegado. Não se trata apenas de “poder”. É poder ao serviço do amor, para o bem dos outros, sobretudo os mais fracos e necessitados.

Se os cristãos acreditassem mesmo nesta divindade pateta e sem alma que muitas pessoas têm na cabeça, faríamos bem em abandonar esse “poder superior” e procurar algo melhor. Aliás, seria um passo essencial para o desenvolvimento espiritual.

O que acontece muitas vezes nestas situações é que a pessoa que supostamente “perdeu” a sua fé, na verdade acaba de enfrentar, de alguma forma distinta, o maior de todos os problemas: o problema do mal. Como é que pode haver mal no mundo se existe um Deus perfeitamente bom e inteiramente amor? Ou então pode simplesmente ter chegado a um ponto em que a vida parece ter perdido o sentido.

A minha recomendação para estas pessoas é para pensarem de onde derivam a própria ideia do “bem”. O que faz com que uma coisa seja “boa?” Quando a vida nos parece injusta, o que é que nos levou a crer que era suposto ter sido justa? De onde vem o “sentido”?

Não teríamos qualquer razão para pensar que a vida, neste cosmos grande, vazio e aparentemente sem sentido, devia ser “justa” se não nos tivesse sido dada essa esperança de algo para lá das realidades físicas e empíricas que nos rodeiam todos os dias.

Como diz C.S. Lewis no seu livro “O Problema do Mal”, o problema intellectual do mal só existe precisamente porque os cristãos propuseram a noção de um Deus perfeitamente bom e que ama perfeitamente. Sem esta noção, o sofrimento não é um “problema”, simplesmente é. O sofrimento e a morte seriam – como muitos acreditam que são – os produtos naturais de um universo essencialmente caótico e desprovido de sentido. Não serve de nada ficarmos desapontados ou zangados sobre esse tipo de coisa.

Sem um Deus providente que nos ama, das duas uma, ou se pode escolher maximizar o prazer e minimizar o sofrimento, como faziam os epicuristas, ou se engole a realidade e aprende-se a viver com ela, como faziam os estóicos. Mas culpar “os deuses” ou “o destino” nestas questões é como erguer os punhos às marés. O mar vai subir e inundar o teu castelo de areia quer queiras quer não. Por isso sai do caminho ou prepara-te para seres submergido.
 
Um Poder Superior
Só aqueles que imaginam que o universe poderia ser melhor, que imaginam que o universo é feito para nós como um lugar de florescimento, é que têm direito a sentir-se desapontados. E quem é que vê a realidade por essa perspectiva? Os epicuristas e os estóicos não. Só quem acredita num criador que criou o universo para nós e que nos ama de tal forma que se dispôs a morrer pelos nossos pecados.

Recorremos a noções de “bondade”, de “justiça” e de “sentido” como se nos pertencessem e depois atiramo-las à cara de Deus quando nós, e o mundo pelo qual somos responsáveis, não correspondem aos seus padrões. Esquecemo-nos é de que Ele é aquilo sem o qual não há sentido. Só existe “justiça” se houver um Criador do que é justo. Não existe “mal” sem um padrão último pelo qual julgamos o “bem”. Sem Ele, não haveria mais do que caos e falta de sentido. 

Os cristãos não acreditam que este é o “melhor dos mundos possíveis”. Bem pelo contrário. A história cristã fala-nos de uma queda para a agonia do pecado, sofrimento e morte. A história cristã oferece-nos um ideal a que podemos aspirar; não nos pede que nos satisfaçamos com a nossa sorte actual. O nosso problema não está em desejarmos demais, está no facto de, na maior parte das vezes, desejarmos de menos.

Alguns dos que supostamente perderam a fé, na verdade estão apenas a experimentar aquela inquietação de um coração que só descansará Nele. Temos a tendência de criar estas categorais confortáveis onde nos refugiar. Não é uma coisa inteiramente má, claro. Pensamos com palavras e compreendemos por categorias. Mas todas as categorias têm as suas limitações.

Deus presta-nos um grande serviço quando rebenta com elas para abrir espaço para Ele: Aquele que está para além de todas as categorias, mais do que um “ser supremo”, um Ser Subsistente em Si mesmo, Fonte de todo o Ser e Bondade – uma pessoa e não um poder, com poder de tal forma incomensurável que se consegue esvaziar dele para se tornar Amor Incarnado, Deus Connosco e Por Nós.


Randall Smith é professor na Universidade de St. Thomas, Houston, onde recentemente foi nomeado para a Cátedra Scanlon em Teologia.

(Publicado pela primeira vez na Quinta-feira, 2 de Julho de 2014 em 
The Catholic Thing)

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1 comment:

  1. Acreditam também num deus sedento de adoração, se uma pessoa for um cidadão exemplar mas não acreditar em deus vai para o inferno e se for um bandido e andar todos os dias a caminhar para a igreja arrependido está absolvido e irá para o paraíso.

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