Wednesday 18 April 2012

O Amor Anseia Conhecer o Amado

Randall Smith

Sugeri anteriormente neste site que aquilo em que acreditamos – o conteúdo da nossa fé – é importante, não porque existe um exame de teologia para entrar no Céu, mas porque a fé cristã é a resposta a uma pessoa e o amor, pela sua própria natureza, anseia conhecer o amado.

Há dias soube de um exemplo que ilustra bem esta questão. Um amigo que é professor de Filosofia estava a ler o Comentário Literal ao Genesis, de Santo Agostinho, uma obra notoriamente complexa, quando um dos seus alunos perguntou, de forma típica para um estudante: “Mas afinal de contas o que é que isto interessa?”

Ao que o meu amigo retorquiu: “Amas Deus?”. “Sim”, respondeu o aluno, surpreendido. “Então escuta”, disse o meu amigo, “Talvez tenhas a sorte de te casar. E se esse dia chegar poderás encontrar-te a ter uma discussão com a tua mulher, ela dirá alguma coisa e tu responderás: ‘não percebo’. Ela tentará explicar-se melhor e, provavelmente, dirás algo do género ‘Mas o que estás a tentar dizer é isto?’, e ela dirá: ‘Não, não é nada disso’”.

“Agora”, continuou o meu amigo, “tens duas hipóteses. Podes dizer ‘Mas afinal de contas o que é que isto interessa?’, ou podes escolher não ser um idiota. Acredita, isto interessa.”

Foi por razões deste género que Santo Agostinho tentou, várias vezes (mais precisamente quatro), escrever um bom comentário ao Genesis. Para ele era muito importante tratar bem o assunto, sem dúvida porque ele acreditava que o Genesis é a palavra de Deus e importava compreender o que Deus estava a tentar transmitir com essas palavras.

Pela mesma razão, se nós, enquanto católicos, acreditamos que o Espírito Santo continua a ensinar através do Magistério da Igreja, então devemo-nos interessar em compreender correctamente essas palavras.

No meu trabalho enquanto professor de Teologia conheço muitas pessoas e oiço muitos “pseudo-respostas”, como eu lhes chamo, aos ensinamentos da Igreja. Há vários tipos diferentes.

O primeiro género baseia-se na total ignorância. Uma pessoa diz: “Discordo totalmente do ensinamento da Igreja em relação a X!”

“Já leste a documentação sobre esse assunto?”

“Claro que não, porque tenho a certeza que não iria concordar.”

De certeza? Quantas vezes não teve a experiência de conhecer alguém que só tinha ouvido falar de si através das conversas que outros têm por detrás das suas costas? “Não gosto das coisas que diz e que faz”, diz-lhe essa pessoa. Mas depois de alguma conversa descobre-se que não fez nem disse nada daquilo que ele pensa que você fez ou disse. Essa pessoa tinha odiado uma ilusão.

Santo Agostinho
É igual com a Igreja. Frequentemente, quando as pessoas me descrevem um ensinamento particular da Igreja que odeiam, acabo por ter de lhes explicar que na verdade a Igreja não ensina nada disso. Já conheci pessoas que não são católicas, e que admitem que não sabem absolutamente nada sobre o Catolicismo, mas que insistem que a Igreja ensina isto ou aquilo, quando na realidade não o faz. Os preconceitos são difíceis de combater.

O segundo tipo de pseudo-resposta aos ensinamentos da Igreja baseia-se numa ignorância parcial e resulta na deturpação desses ensinamentos em direcções predeterminadas.

Por exemplo, a Igreja ensina que a propriedade privada é um elemento importante para o florescimento da humanidade. O que algumas pessoas ouvem é que a Igreja ensina que a propriedade privada deve ser defendida a todo o custo. Errado.

Por exemplo, a Igreja prega o destino universal dos recursos humanos. Sim. Mas o que alguns ouvem é que a Igreja defende que os programas de redistribuição estatais são moralmente obrigatórios. Errado.

Na verdade, a Igreja ensina tanto o valor da propriedade privada como o destino universal dos recursos humanos.

Das duas, uma: Podemos tentar distorcer os ensinamentos da Igreja para se adequarem às nossas predisposições, ou podemos tentar perceber o que a Igreja verdadeiramente ensina. Requer esforço. Os preconceitos são difíceis de combater.

Na América, quando se é conservador, a tendência é de dizer sim aos ensinamentos da Igreja sobre a moral sexual, mas não aos ensinamentos sobre justiça social. Quando se é liberal, acontece o contrário. Quando o Magistério diz aquilo que queremos ouvir, consideramos os bispos “proféticos”, quando ensina aquilo de que não gostamos, dizemos que são velhos alheados da realidade.

As pessoas perguntam, “Mas o que é que uma série de padres sabe sobre isto ou aquilo?” Pode-se preencher com qualquer tema: sexo, economia, guerra, política, ciência e tecnologia, como bombardear uma cidade, etc. Para começar, digamos que a sua sabedoria colectiva é muito como a da sua mãe: provavelmente maior do que você pensa. Mas não confiamos na sabedoria dos bispos só por si, confiamos na promessa que Cristo fez de que estaria com a sua Igreja até ao fim dos tempos, e que enviaria o seu Espírito Santo para a guiar e proteger.

Se gosta da sua mãe, procurará saber o que ela diz, e toma atenção à forma como o faz para compreender as suas verdadeiras intenções. Quando ela insiste que algo é verdadeiramente importante, não o entendemos como uma “recomendação”, e quando diz que uma coisa “seria simpática”, não o interpretamos como um mandamento divino.

É o mesmo com a Igreja, se estiver a ouvir porque se interessa verdadeiramente pelo que está a ser transmitido, então não transforma o aborto, por exemplo, em só mais uma questão, para depois tratar a energia alternativa como um mandamento de Deus. Bem como, se ama a sua mãe e se tem um mínimo de bom senso, não lhe dá uma palmadinha nas costas quando ela lhe diz algo importante, respondendo com um “sim, sim, mãezinha, tão querida e antiquada”.

Todos nós ouvimos de forma selectiva e, por vezes, ouvimos só o que queremos. Mas se a Palavra vai fazer uma diferença nas nossas vidas, então as palavras que Ele nos transmite têm de ser importantes para nós também. O amor anseia compreender o amado.


Randall Smith é professor de teologia na Universidade de St. Thomas, Houston.

(Publicado pela primeira vez no Domingo, 15 de Abril 2012 em www.thecatholicthing.org)

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