Wednesday, 1 September 2021

Uma Resposta Cristã à Derrota

Michele Malia McAloon

Retirada ou derrota? Os guerreiros do teclado e os livros de história debaterão esta questão durante décadas. Para a maioria dos americanos a ver o desastre no Afeganistão, esta é apenas uma questão de orgulho nacional, e não um assunto existencial que lhes afecta directamente as vidas. Infelizmente, para a pequena minoria de americanos que opta por combater, põe-se agora a questão de saber se vinte anos de combate contínuo valeram o preço que lhes foi cobrado a eles, às suas famílias e à nação.

Para a maioria dos americanos, a realidade das guerras no Afeganistão e no Iraque foi um fardo suportado por outros. Políticos sem qualquer conhecimento militar e sem filhos a servir nas forças armadas decidiram depressa, talvez irresponsavelmente, por uma intervenção militar. Ao mesmo tempo não houve qualquer apelo à juventude para pegar em armas. Desde o início de ambas estas guerras houve uma atitude generalizada de que esta era a guerra de outros. Certamente não era uma questão de responsabilidade pessoal, nem para os membros da própria família.

Não houve apelos a mobilização popular para plantar comida ou comprar obrigações de guerra, nem de fazer o mais pequeno dos sacrifícios para reconhecer, muito menos contribuir para o esforço de guerra. Em vez disso a política "woke" e as compras é que estiveram na ordem do dia. Palavras de agradecimento pelo serviço dos veteranos soaram a pouco enquanto as candidaturas à universidade, bolsas desportivas e preparação para os exames evitaram que a maioria dos pais considerassem sequer o serviço militar como opção para os seus filhos.

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Desde 2001 quase três milhões de militares serviram nos teatros de guerra que se seguiram ao 11 de Setembro, no Afeganistão e no Iraque. Tristemente, mais de 7.000 militares americanos, a que se acrescentaram agora mais 13, perderam as vidas ao longo de duas décadas da guerra contra o terrorismo. Muitos dos nossos aliados europeus também sofreram baixas pesadas. Mais trágico ainda é o número de soldados que se suicidaram depois de regressar a casa. As feridas psicológicas do stress pós-traumático provaram ser mais mortíferas que o combate em si. Quatro vezes mais veteranos de guerra, mais de 30,177 pessoas, suicidaram-se do que aqueles que morreram em batalha.

Esta guerra foi uma questão familiar. Muitos militares serviram várias missões, passando mais tempo fora do que em casa ao longo das últimas duas décadas. O ciclo de missão, regresso a casa e preparação para a próxima missão nunca acabou. O custo íntimo foi suportado por familiares, esposos, pais, filhos e amigos que tiveram de lidar com a ausência e – frequentemente – tiveram de se adaptar às mudanças naqueles que regressavam do campo de batalha.

Desde o início desta retirada brutal e caótica do Afeganistão, esposos de soldados têm estado a postar fotografias de cerimónias de boas-vindas em que participaram ao longo de vários anos, para os seus familiares. Fotos de duas, três ou quatro cerimónias, com as crianças a envelhecer, são um testemunho do verdadeiro custo pessoal suportado por famílias militares durante esta guerra.

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Os relatos de que os afegãos não estavam dispostos a combater são simplesmente falsos. Os soldados afegãos morreram a uma taxa de 27 vezes mais que os americanos e seus aliados. Ao longo dos últimos 10 dias os oficiais americanos têm estado a responder a chamadas e mensagens dos seus parceiros e intérpretes afegãos, pedindo ajuda. Velhas feridas reabriram agora que muitos não têm a capacidade para prestar o auxílio de que os seus leais colegas precisam para poderem escapar aos Taliban.

A guerra e o conflito são tão antigos como a humanidade; a derrota idem. Mas derrota e derrotado não são a mesma coisa. O Antigo e Novo Testamentos, bem como as vidas dos santos, estão cheios de exemplos de perda e renovação. Moisés encontrou esperança nos 40 anos de travessia do deserto, sem o prémio de entrada na Terra Prometida. São Paulo encontrou a sua vitória final na cadeia. Ele sabia que a verdadeira vitória vem apenas na celebração da esperança, na paciência nas tribulações e na constância da oração (Romanos 12,12). Santos e pecadores, ao longo dos anos escolheram erguer-se da derrota transformando um passado doloroso num futuro de esperança através da fé e do serviço a algo maior que si mesmos.

Ironicamente, a nossa renovação enquanto nação, igreja ou comunidade de crentes poderá nascer do exemplo de serviço que está a ser dado, mesmo agora, à sombra das suas dificuldades e perda, pela nossa comunidade militar. Militares e suas famílias, pessoas sem grandes meios financeiros ou materiais, que foram os mais afetados pelas guerras americanas no Afeganistão e no Iraque continuam a servir, sacrificar e perguntar que mais podem fazer para ajudar.

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Com os refugiados afegãos a começar a ser realojados em centros de detenção financiados pelos EUA, na Alemanha, uma legião de famílias de militares e de veteranos estão a oferecer-se como tradutores e voluntários. Tenho-os visto ao longo dos últimos dias, na Base Aérea de Ramstein, a dar uma resposta que só consigo descrever como arrepiante.

O simples gesto de um familiar de militar a comprar fraldas para um bebé afegão cujo pai até poderá ter contribuído para a violência dirigida contra os seus entes queridos representa um momento definidor para a nossa nação. O serviço e o sacrifício acrescidos, em vez do recuo para o ressentimento, tornaram-se uma fonte de cura. O serviço e a dádiva são um mero reflexo para aqueles que optaram por servir. Os americanos devem reflectir profundamente sobre este humilde exemplo.

Para os cristãos a derrota está sempre ao virar da esquina. A vida cristã é um combate contra o pecado, a tentação e o desespero. A nossa verdadeira força vem dos mandamentos tão simples, mas tão difíceis de pôr em prática, de amar a Deus e ao próximo. Um futuro menos violento poderá estar a ser gerado nos corações de homens e mulheres dispostos a ordenar as suas vidas segundo os mandamentos de Deus.

Numa sexta-feira, há vários séculos, numa colina deserta no Médio Oriente chamada Calvário, a derrota e a morte pareceram absolutos. Três dias mais tarde, quando o sol nasceu iluminou um sepulcro vazio – a mais profunda vitória na história da humanidade. A derrota só pode ser temperada pelo amor e no conhecimento de que a sua vitória é a nossa, agora e para sempre.

São Miguel Arcanjo, Defendei-nos no combate.

Fotos:

1. Elementos das Forças Especiais americanas a cavalo no Afeganistão, em Outubro de 2001. (Foto: FA Americanas).

2. Os caixões de Hunter Lopez, Rylee McCollum, David Lee Espinoza, Kareem Nikoui, Jared Schmitz, Daegan Page, Taylor Hoover, Humberto Sanchez, Johanny Rosario, Dylan Merola, Nicole Gee, Max Soviak e Ryan Knauss, os soldados mortos no recente atentado em Cabul. Dover Air Force, Delaware, 29 Agosto de 2021. (Foto: U.S. Marine Corps).

3. Os primeiros evacuados do Afeganistão da Base Aérea de Ramstein, na Alemanha, para os EUA, depois da meia-noite do dia 23 de Agosto de 2021. (Foto: Força Aérea EUA)


Michele Malia McAloon é casada há quase 28 anos. É mãe, oficial das Forças Armadas americanas na reserva e advogada de direito canónico. Vive em Wiesbaden, na Alemanha. Pode ouvir o seu podcast “Cross Word” no Spotify, Apple Podcasts e archangelradio.com.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na terça-feira, 31 de Agosto de 2021)

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