Thursday, 1 June 2023

Crise de bispos em Portugal

Ao longo da última semana foram nomeados dois bispos auxiliares para o Porto. São nomeações muito importantes, porque embora o Porto estivesse com dois bispos auxiliares, D. Pio Alves, já tinha ultrapassado há muito a idade de resignação, que foi finalmente aceite.

Para além disso, D. Manuel Linda, o actual bispo do Porto, está numa situação bastante fragilizada pela forma como tem estado a lidar com a questão dos abusos na sua diocese. Recorde-se que na lista que a Comissão Independente fez chegar à diocese do Porto constavam os nomes de sete padres no activo. Três foram provisoriamente afastados de funções enquanto decorre a investigação prévia, mas os outros quatro não, embora os seus processos também tenham sido entregues a Roma. Esta diferença de tratamento nunca foi explicada e, tanto quanto eu consegui apurar não parece ter havido grande critério. D. Manuel Linda tem 67 anos, ou seja, está a oito anos da idade de resignação. Caso esteja para ficar no Porto até ao final, precisa de ajuda e apoio para poder cumprir as suas funções. Deus queira que os novos bispos auxiliares, Joaquim Dionísio e Roberto Mariz, possam dar esse apoio.

Mas as nomeações para o Porto eram apenas duas das muitas que faltavam em Portugal. Vejamos algumas das outras situações.

Setúbal – A longa espera

A situação da Diocese de Setúbal é verdadeiramente lamentável. Há quase um ano e meio que D. José Ornelas deixou a diocese para assumir Leiria-Fátima, e desde então Setúbal está sem timoneiro. É certo que tem um administrador apostólico, mas não é a mesma coisa. Os padres precisam de um bispo como referência e os leigos precisam de um pastor que os reúna e confirme na fé. A sensação entre os católicos – clero e leigos – de Setúbal é de abandono e isso é uma grande pena.

Auxiliares

Setúbal é a única diocese sem bispo diocesano, desde que D. Nuno Almeida passou de auxiliar de Braga para bispo de Bragança, que também estava sem bispo há mais de um ano. Mas essa passagem de D. Nuno Almeida para Bragança deixou Braga sem auxiliar e Lisboa também tem menos um auxiliar do que é normal, desde a morte prematura de D. Daniel.

Resignações à porta

Mas essa é a contagem mais conservadora… Porque realisticamente Lisboa vai precisar ainda de outro auxiliar para substituir D. Joaquim Mendes, que tem já 75 anos e por isso já submeteu o seu pedido de resignação e muito provavelmente precisará de outro para substituir D. Américo Aguiar que dificilmente se manterá como auxiliar muito mais tempo.

E, por fim, há uma série de bispos diocesanos que também estão à beira da idade da resignação, ou então já a ultrapassaram. Para começar, D. Manuel Clemente. O Patriarca de Lisboa faz 75 anos em Julho. Seria normal, noutras circunstâncias, o Papa adiar a aceitação da resignação de um arcebispo até aos 77 anos, ou mesmo mais, mas neste caso D. Manuel nunca escondeu o facto de não estar bem de saúde e de estar muito cansado, e até disse na Missa Crismal deste ano que seria a última vez que celebra enquanto Patriarca, por isso está claramente de saída. É evidente que, em condições normais, não haverá nomeação antes da Jornada Mundial da Juventude, mas o processo já está a andar e por isso não deve tardar vir um novo Patriarca para Lisboa.

(Isso levantará outra questão, que é o facto de D. Manuel Clemente ainda ter mais cinco anos como cardeal eleitor, o que deverá atrasar a elevação a cardeal do seu sucessor, não obstante a existência de uma bula que estipula que o novo Patriarca de Lisboa seja feito cardeal no primeiro consistório depois da sua eleição, o que já foi ignorado no caso de D. Manuel).

Bem vistas as coisas, portanto, Lisboa deverá contar, num futuro relativamente próximo, com um novo Patriarca e de três bispos auxiliares, sendo que a primeira nomeação a ser conhecida deverá ser a do Patriarca, que depois terá uma palavra importante a dizer na escolha dos seus auxiliares.

Temos ainda o caso do bispo de Beja, D. João Marcos, que tem apenas 73 anos, mas está com problemas de saúde e já pediu ao Papa que aceite a sua resignação antecipada.

E D. Manuel Felício, bispo da Guarda, já atingiu os 75 e por isso também já submeteu a sua resignação. E o bispo de Portalegre-Castelo Branco, D. Antonino Dias, faz 75 anos no final deste ano.

Feitas as contas, entre as posições vacantes e as que estão prestes a ficar vacantes, Portugal está a precisar de 9 bispos num futuro imediato, ou dez se incluirmos D. Manuel Quintas, bispo do Algarve, que faz 75 em Agosto de 2024.

Porquê a demora na nomeação de substitutos? Bom, a razão mais evidente é que as nomeações vêm todas de Roma e Roma tem muito com que se preocupar. Como estão estas dioceses vacantes ou a vagar em Portugal, há largas centenas no resto do mundo e todas elas precisam de atenção.

Mas poderá ser mais que isso. Constou-me que em algumas situações os padres abordados para serem nomeados bispos têm recusado. Não sei de casos particulares, portanto não quero generalizar, mas essas recusas podem ter vários fundamentos. É evidente que nalguns casos pode ser por genuína humildade, o padre pode sentir que não é capaz de desempenhar bem esse cargo; pode ser por medo, e basta ver em Portugal a porrada, por assim dizer, que os bispos têm levado nos últimos meses para entender que poucos cobiçam estar nessa posição; e por fim, infelizmente, nalguns casos pode ser porque o candidato aspira a mais do que ser apenas bispos de uma diocese perdida no interior, preferindo uma outra diocese mais movimentada e com outras perspectivas de “carreira”. Se for este último caso, então talvez devamos agradecer as recusas, porque aquilo de que menos precisamos são de pastores que escolhem as suas ovelhas consoante o prestígio que delas podem retirar.

Aos padres que me lêem, caso recebam essa chamada, lembrem-se que a função não é para vocês, é para o resto da Igreja, e sem me querer intrometer no vosso discernimento e nas vossas orações, peço-vos a coragem de dizer que sim e de não deixar os rebanhos sem pastor por demasiado tempo, não vão elas começar a tresmalhar.


4 comments:

  1. Na minha humilde opinião, não vejo necessidade de haver bispos auxiliares que não seja a de fazerem um "estágio" para mais tarde serem nomeados bispos diocesanos. De resto, nada há que façam que não possa ser feito por vigários (a não ser ordenações, mas não me parece que haja propriamente falta de bispos para as fazer). Deste ponto de vista, não entendo por que razão Lisboa precisa de ter três bispos auxiliares, por exemplo.

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    1. Plenamente de acordo, os Bispos Auxiliares e ainda por cima com Sés Titulares são uma vergonha para o ecumenismo. Durante anos tivemos sucessivos Arcebispos de Mitilene que eram os Bispos auxiliares mais importantes do Patriarcado a seguir ao Sr. Patriarca. Ora na ilha de Lesbos havia outro Bispo de Mitilene (Ortodoxo grego). Um dia contaram-me que no antigo Restaurante Dionisios ao pé dos Jerónimos um grego perguntou se era o seu Bispo que estava cá em Lisboa. Surreal...

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  2. Experimente acompanhar o fim de semana de um bispo auxiliar, sobretudo por esta altura de crismas e visitas pastorais

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    1. O que faz o bispo auxiliar no fim de semana que descreve que não possa ser feito por um vigário geral ou episcopal?

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