Wednesday, 12 October 2022

Prega sempre o Evangelho. Usa mais vezes palavras

Peter Laffin

No mês passado casei-me com a minha linda e graciosa mulher. A melhor parte do copo-de-água foi quando nos sentámos os dois a ver amigos e família finalmente a conviver, a beber vinho e a divertirem-se na pista. Foi um vislumbre do Céu. Pareciam anjos iluminados.

Os meus amigos também gostaram de me ver no dia. Sobretudo aqueles que não me viam há algum tempo. O que fazes tu com uma mulherona destas?, brincavam, e eu ria-me, cúmplice.

Mas o que mais os surpreendeu foi a celebração tão marcadamente católica, que decorreu na Catedral de St. Patrick, em Norwich, no Connecticut. Converti-me do ateísmo ao catolicismo quando tinha vinte e tal anos (agora tenho 39). Isso não era surpresa para ninguém, mas poucos esperavam que a minha fé tivesse primazia num dia que era, ostensivamente, sobre mim e a minha mulher.

Mesmo aqueles com quem tenho estado mais nos últimos anos ficaram admirados com a falta de subtileza. O meu círculo social manteve-se bastante secular-liberal depois da minha conversão. Uma vez que me converti já depois da universidade, nunca fiz parte de grupos de jovens católicos. E embora tenha vivido a minha fé de forma aberta, nunca a esfreguei na cara dos meus amigos. Acho (espero) que com isso ganhei o respeito deles ao longo dos anos.

Já ouvi conversas suficientes em festas para saber o que pensam sobre o Catolicismo. E certamente já vi o que chegue nas redes sociais.

Mas o amor deles por mim é superior ao ódio pela religião. Se é bom para mim, está bem para eles. E por isso foram capazes de apreciar a minha fé enquanto terapia, como se tivesse começado a praticar ioga ou adoptado uma dieta mais saudável. O catolicismo era apenas mais um item no meu plano de bem-estar pessoal, por pouco apelativo que lhes parecesse.

E por isso o nosso casamento profundamente católico foi um choque para eles, como teria sido caso eu tivesse casado num estúdio de ioga e tivesse dado graças e todo o louvor ao Mestre Yogi.

“Eras uma pessoa tão ansiosa”, disse-me um velho amigo durante a festa. “Acho que a religião te tem feito bem.”

E é verdade. Eu era uma desgraça antes, por isso aceitei o elogio.

“Eu sabia que te tinhas convertido ao catolicismo”, disse outro, “mas não sabia que eras mesmo católico”

“Nunca o escondi”, respondi. “Mas não andavas por aí com uma grande cruz à volta do pescoço, nem nada”, disse ele.

“O terço pendurado do espelho retrovisor não conta?”

“Seja como for”, disse ele. “Estás com bom ar. Estou muito contente por ti”, e deu-me um grande abraço.

Desde que entrei para a Igreja sempre fui a favor da abordagem de mostrar mais e falar menos, no que respeita a evangelização. “Prega sempre o Evangelho. Se necessário, usa palavras”, disse, supostamente, São Francisco de Assis, embora tenha dificuldade em imaginá-lo a usar tais expressões melosas.

É um belo sentimento: devemos aspirar a viver o Evangelho de tal forma que deixaria de ser necessário recorrer aos argumentos racionais. Mas é também muito pouco prático (eu não sou suficientemente santo para o conseguir) e suspeitamente conveniente. Se nunca dizemos quem somos, a tentação de levar uma vida dupla torna-se demasiado forte.

O modelo de pregar pelo exemplo também nos dá uma escapatória para não termos de explicar as partes mais complexas da nossa fé. Mesmo as premissas mais básicas – que a nossa existência se deve a um Criador que, qual bom progenitor, respeita a nossa liberdade na mesma medida em que nos ama, loucamente – requer preparação, prática e esforço.

São Francisco a pregar, com palavras
Durante décadas os católicos americanos, incluindo eu, pregaram tão zelosamente pelo exemplo que agora temos uma geração inteira que é funcionalmente analfabeta no que diz respeito ao Catolicismo. A única coisa que a maioria dos jovens sabe sobre a Igreja é que a odeia.

Partem do princípio que quando usamos a palavra “Deus” nos estamos a referir a um Pai Natal cósmico que só concede desejos a quem se benze antes das refeições. Ou a uma projecção freudiana para a realização de desejos (a descrença em Deus encaixa melhor aqui para uma espécie com inclinação para o pecado). Ou então a um moderno Ódin, um Ser Muito Grande entre outros Seres Muito Grandes, a batalhar no espaço.

Ainda no mês passado o popular filósofo Sam Harris tentou provar a inexistência desta versão particular de Deus, referindo que mesmo os telescópios mais avançados não o revelam.

A sério?

Pessoas como estes meus amigos também não fazem ideia do que significa “Cristo”. Pensam que Jesus – se é que existiu – era uma versão primordial do guerreiro de justiça social (e possivelmente um zombie, o que até consideram bastante fixe). Não sabem o que diferencia a Igreja Católica dos Presbiterianos ou da Igreja Baptista de Westboro. Não conseguiriam distinguir o Espírito Santo do Novo Banco.

Porquê? Porque os católicos não lhes explicaram.

Pois bem, acabou. Chegou a altura de pregarmos o Evangelho e de usarmos palavras mais vezes, sobretudo aqueles de nós com amigos e conhecidos no mundo secular.

Para que fique claro, não estou a sugerir começar cada conversa com as palavras: “Já ouviste a Boa Nova?”, nem que levemos todas as conversas para uma explicação da Presença Real de Cristo na Eucaristia.

Só peço que fiquemos atentos a oportunidades evangélicas que se possam apresentar. Que quando se abre uma brecha numa conversa, ajudemos a escancarar a porta para que a luz possa entrar.

Para mim, um bom começo seria uma resposta à reacção dos meus amigos ao meu "Casamento Muito Católico".

Poderia explicar-lhes que não é por razões terapêuticas que tenho a minha fé, embora seja saudável. De facto, não pratico a minha fé por nenhuma razão secundária, mas sempre como um fim em si mesmo. Porque deixar-me morrer na Luz é o único acto racional. Porque cada vez que penso que compreendi Cristo ou senti toda a força do seu abraço, abre-se um novo abismo que me engole. Porque o Catolicismo é verdade e beleza sem fim.

Mas acima de tudo porque estou apaixonado. E porque, inexplicavelmente, a Luz também está apaixonada por mim.

Talvez lhes diga isso mesmo. Talvez tenha acabado de o fazer.


Peter Laffin escreve de New England. O seu trabalho mais recente encontra-se no The Catholic Thing, The Washington Examiner, e The National Catholic Register.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no Domingo, 9 de Outubro de 2022)

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