Wednesday, 29 August 2012

Aborto e Violação

Austin Ruse
A violação e o aborto têm dado muito que falar nestes dias. Infelizmente um bom político entrou de forma pouco competente numa zona politicamente explosiva e acendeu um fósforo.

Uma violação é, frequentemente, o evento mais devastador, em termos físicos e emocionais, da vida da vítima, que pode ser inundada por sentimentos de culpa, tristeza e depressão. As vítimas falam mesmo de uma sensação de sujidade. Nunca devemos menorizar este crime horrível.

É por isso que o argumento contra o aborto em casos de violação é tão difícil de fazer passar por parte do movimento pró-vida e de compreender pela sociedade. Esta é a posição da maioria dos grupos pró-vida e, também, a posição da Igreja Católica. Matar uma criança inocente nunca é justificável, mesmo que essa vida tenha sido fruto de uma violação.

A lógica é inatacável. Um nascituro é um ser humano único que, por natureza, detém certos direitos. O principal de entre eles é o direito à vida, que nunca pode ser abrogado, nem que seja em consequência de outro bem, neste caso tentar apagar a terrível dor de uma vítima de violação. Um bebé por nascer não pode ser punido pelos crimes do seu pai biológico.

Para dizer a verdade, muitos consideram isto uma perfeita loucura. Para alguns, até parece uma crueldade. Como explica Serrin Foster, presidente da Feministas pela Vida, a vítima de uma violação merece todo o amor que possamos encontrar e devemos procurar punir o agressor de forma expedita e justa.

Alguns argumentam: “Se obrigar uma mulher a carregar o filho do seu violador, isso será uma recordação diária, ao longo de nove meses, do momento mais traumático da sua vida”. Há uma certa verdade nisso. Se catalogarmos o bébé como co-autor do crime, então a sua presença será uma agressão diária. Na verdade, a pesquisa revela que esta é uma realidade para muitas mulheres com gravidezes não planeadas ou indesejadas, não apenas de violação. Elas encaram o bebé como uma ameaça às suas próprias vidas.

Mas algumas vítimas de violação chegam a um entendimento diferente sobre o seu bebé. Existem testemunhos apaixonantes de mulheres que temiam precisamente ver nos seus filhos a cara dos violadores, mas em vez disso encontraram nada mais que a cara querida de um bebé.

As crianças concebidas por violação podem ser as melhores testemunhas da verdade insofismável de que cada bebé humano é um dom de Deus. Temos disso importantes exemplos, recordo-me assim de repente da advogada e oradora Rebecca Keissling e da activista Ryan Bomberger.

Os activistas espertos procuram sempre combater em terreno favorável, e não no terreno dos seus inimigos. É por isso que a luta contra o aborto por nascimento parcial [também conhecido como aborto tardio, ou do terceiro trimestre, no qual o bebé é rodado e o parto feito até que só a cabeça continue dentro do corpo da mãe. Nessa altura fura-se o crânio com um instrumento médico, de forma a que quando se termina o parto o bebé nasce já morto] teve tanto sucesso na alteração do debate sobre a interrupção da gravidez nos Estados Unidos. Essa campanha teve lugar no terreno preferido pelos defensores da vida. Foi uma parvoíce da parte dos pró-aborto combater nesse terreno, que os deixou tão mal vistos, mas não o puderam evitar. Até a Frances Kissling, na altura presidente do movimento Catholics for a Free Choice [Católicos pela Liberdade de Escolha], confessou que a defesa do aborto por nascimento parcial custou ao seu movimento “muitos católicos pró-escolha”.
Lisa Askew, vítima de
violação e o seu bebé
Os nossos opositores neste campo também gostam de lutar no seu próprio terreno. Querem fazer deste um debate sobre casos difíceis, particularmente os casos de violação. Qualquer pessoa que fale deste assunto com amigos, família ou até estranhos, quase imediatamente se vê confrontada com a mesma situação em que se viu envolvido o congressista Todd Akin na semana passada. Tornar possível o aborto para vítimas de violação é o argumento pró-escolha por excelência, coloca-nos a nós na posição de defensar o que parece indefensável.

Uma solução fácil é simplesmente ceder – a título meramente argumentativo. “Tudo bem, fiquem com os casos difíceis. Podem ter o aborto para os casos de violação e perigo para a vida da mãe. Isso equivale a menos de 2% de todos os casos de aborto, ou cerca de 20 mil por ano”, [números relativos aos EUA].

Este argumento revela como os casos extremos, embora claramente complexos, são muito poucos no âmbito alargado do aborto. Muitos americanos pensam que estes casos são a maioria. Deixar isto claro obriga os defensores do aborto a ter que justificar os restantes 1,180,000 abortos que são praticados por outras razões.

Tenha presente que a maioria dos americanos pensa que a maior parte dos abortos devia ser proibida. Na sua vasta maioria os abortos são feitos a mães e bebés saudáveis.

Mas o problema é que, a não ser que se dedique a esta causa a tempo inteiro como voluntário ou como profissional, estes argumentos não surgem de forma rápida ou fácil. No calor da argumentação qualquer pessoa pode cometer erros.

Isto é especialmente verdade para o caso de políticos que têm de estar a par de dezenas de assuntos ao mesmo tempo e precisam de estar preparados para responder sobre todos eles a qualquer altura. Isto torna o aborto em casos de violação um verdadeiro campo minado em termos políticos.

Regra geral o movimento pró-vida permite aos políticos defender as excepções e ainda assim considerarem-se pró-vida. George Bush defendia o aborto nos casos extremos mas o movimento considera-o o presidente mais pró-vida da nossa história.

Enquanto defensores da vida consistentes devemos ajudar as vítimas da violação a perceber que ficar com o seu bebé poderá não lhes destruir a vida, mas antes ser precisamente aquilo que lhes dará alegria e sentido.

Lisa Askew, que agora tem vinte e poucos anos, disse a um jornal que tinha sido violada aos 16 anos. Ela ficou com o bebé, mas rejeitou-o e não podia ser deixada sozinha com ele. Depois aconteceu alguma coisa, o amor entrou em acção. “Eu sei que ele tem os olhos e o cabelo do pai, mas quando olho para ele não vejo outra coisa que não o meu filho lindo. Nunca deixa de me espantar que algo tão maravilhoso possa ter vindo de algo tão terrível. É o meu rapazinho lindo e não o trocaria por nada deste mundo”.



(Publicado pela primeira vez na Sexta-feira, 24 de Agosto de 2012 em www.thecatholicthing.org)

Austin Ruse é presidente do Catholic Family & Human Rights Institute (C-FAM), sedeado em Nova Iorque e em Washington D.C., uma instituição de pesquisa que se concentra unicamente nas políticas sociais internacionais. As opiniões aqui expressas são apenas as dele e não reflectem necessariamente as políticas ou as posições da C-FAM.

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