Thursday, 20 October 2022

Abusos na Igreja em Portugal – O que aprendemos até agora

Pedro Strecht, da comissão independente
Têm sido um verão e um outono quentes para a Igreja portuguesa no que diz respeito a abusos sexuais cometidos em ambiente eclesial.

Muitos casos novos, muitas acusações, muitas investigações. Penso que vale a pena fazer agora um pequeno apanhado do que sabemos e do que aprendemos até agora.

A comissão independente fazia falta

Esta é a primeira grande conclusão. Repare-se que o ano passado já existiam comissões em todas as dioceses de Portugal. Contudo, e segundo o que transparecia, só tinham sido reportados poucos casos. A criação da comissão independente, liderada por Pedro Strecht mudou tudo. Segundo a última conferência de imprensa da comissão já foram validados mais de 400 testemunhos. Isto só pode querer dizer uma coisa. As pessoas – bem ou mal – não confiam nas comissões diocesanas. Não acho que isto tenha a ver com a personalidade dos bispos ou dos membros particulares destas comissões, tem a ver com a sua própria natureza. Uma comissão liderada por um bispo, como acontece em algumas dioceses, ou por um padre, não pode ser considerada independente e para o comum dos mortais isso será sempre visto como a Igreja a investigar-se a si mesma.

O resultado é que quando foi criada a comissão independente as acusações surgiram em muito maior número. E atenção que, segundo ouvi dizer, a esmagadora maioria dos testemunhos recebidos pela comissão são do litoral e das cidades, o que significa que o número real até pode ser bem maior.

Não sei se o fizeram contrariados, ou se houve divisões internas, nem isso interessa agora. O que é facto é que os bispos portugueses optaram por criar a comissão e em boa hora o fizeram. O próprio Pedro Strecht diz que as dioceses estão a colaborar e que não existe qualquer pressão sobre a comissão. Ainda bem! É bom sinal.

Endémico

Na mesma conferência de imprensa Pedro Strecht usou uma palavra muito importante. Não vi a maioria dos órgãos de comunicação social a fazer grande caso, mas a mim parece ser fundamental. O número de casos permite concluir que o problema dos abusos, em alguns locais, se tornou “endémico”.

Esta é a palavra fatal. Abusos sempre terá havido, em todos os quadrantes da sociedade, todas as classes, todas as profissões. E por mais que o desejemos, dificilmente conseguiremos um mundo em que deixe de haver. Isso não é nada de novo. A questão sempre foi saber se o que tínhamos em Portugal eram casos pontuais, que foram tratados de forma melhor, pior, ou de todo, ou se tínhamos um problema em maior escala, um problema de cultura de abusos e de encobrimento. O termo usado por Strecht é por isso da maior importância porque permite concluir que em Portugal, em muitos lugares, o problema chegou mesmo a ser de uma cultura de abusos, que não se podem resumir às más acções de um homem desequilibrado.

Apenas o relatório final nos permitirá saber o verdadeiro grau deste problema endémico, e em que lugares isso acontecia. Mas quebra-se o mito, de facto, de Portugal ser uma exceção ao que se passou em vários outros países.

A Igreja está a aprender

Isto é fundamental. Há meses que escrevo, digo, e insisto que um dos grandes problemas da parte da Igreja tem sido falhas de comunicação. Sei agora que isso está a mudar. Os bispos já se estão a aconselhar junto de quem sabe. Nos últimos tempos pelo menos três dioceses que têm sido mais faladas a este respeito contrataram, ou pediram ajuda a, especialistas em comunicação.

Não se trata certamente de arranjar formas de iludir o público, ou disfarçar problemas, mas antes de não agravar problemas sérios, como são os abusos, com respostas mal pensadas, coisas ditas sob pressão e falta de linhas de conduta no que diz respeito à informação prestada.

Dou um exemplo prático, para que isto não fique só no abstrato. Critiquei comalguma dureza a falta de uma linha orientadora do Patriarcado de Lisboa na comunicação de casos. Em Agosto anunciaram um caso, no dia em que ia ser publicada uma reportagem sobre esse mesmo padre. Dias depois soube-se, de fonte da comissão diocesana, que havia também outro caso em investigação. Porque é que um foi alvo de comunicado e outro não? Obviamente tinha sido porque o primeiro caso ia sair na imprensa e o Patriarcado quis antecipar-se. Mais tarde foi dito que de facto havia um segundo caso, mas que este seria comunicado publicamente quando chegasse uma decisão de Roma. Entretanto, há dias, o Patriarcado chegou mesmo a publicar uma nota sobre esse caso, que envolvia o pároco de Massamá. Obviamente eu, e outros, suspeitámos que o faziam mais uma vez porque estava prestes a sair uma reportagem, mas, entretanto, soube que não. Fizeram-no, por sua livre iniciativa, cumprindo assim o desígnio da transparência que tanto se exige, e assumindo assim o controlo da narrativa, evitando ter de estar sempre a reagir à agenda mediática.

Esta é a melhor estratégia e a mudança revela humildade, vontade de aprender e de adoptar melhores práticas.

Ainda há muito para saber, e há muito para aprendermos todos. Que todos – bispos, clero, leigos, jornalistas e especialistas em comunicação – o saibamos fazer com amor à verdade e em vista do melhor para a Igreja e para as vítimas, sejam elas pessoas que foram abusadas, sejam elas pessoas que foram falsamente acusadas.

Mais sobre este assunto dos abusos na Igreja

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Cronologia de casos de abusos na Igreja em Portugal

Contributos para uma reflexão sobre casos de abusos na Igreja

Bons sinais da comissão independente

1 comment:

  1. Esta comissão é tão vergonhosa quanto os abusos, pois é um tribunal que permite à opinião pública e aos detractores da própria Igreja julgá-La. É infame que, publicamente, isto tenha sido feito. É (aparentemente) um acto de autodestruição levado a cabo pelos marxistas infiltrados na Igreja e por alguns clérigos desejosos de agradar e serem politicamente correctos. Tudo isto devia ser tratado sim, rigorosamente mas em segredo total, porque não é a Igreja que comete este crime, mas as pessoas más que lá estão dentro, nomeadamente homossexuais!

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