Tuesday, 8 February 2022

Ursos Pardos e a Nova Criação

Pe. Thomas Weinandy

A primeira vez que vi um urso pardo foi há muitos anos, nas Montanhas Rochosas, no Canadá. Por alguma razão fiquei cheio de vontade de lhe fazer uma festinha. Era tão grande e peludo. Seria maravilhoso, pensei, poder fazer festinhas a um urso pardo. Claro que se pode sempre fazer festinhas a um urso pardo sedado, mas isso não conta. Seria batota, e por isso não daria a mesma satisfação. O problema, obviamente, é que muito antes de eu conseguir chegar suficientemente próximo de um urso pardo para poder fazer-lhe uma festinha, ele faria uma “festinha” a mim e assim terminaria abrupta e conclusivamente esse meu propósito. O que me conduz ao ponto onde quero chegar.

Qualquer bom tomista nos dirá que os animais, mesmo o eminente urso pardo, não têm almas imortais e, por isso, deixam de existir quando morrem. Isso pode bem ser verdade. Mas eu sei, contudo, que no final dos tempos, quando Jesus regressar na sua glória, inaugurará uma Nova Criação, um Novo Céu e uma Nova Terra. Normalmente, quando pensamos nessa nova criação, pensamos nas estrelas, nas montanhas, nas plantas e nas árvores que ganharão uma novidade e um esplendor que as nossas imaginações não conseguem alcançar. Mas os animais não constam.

A Bíblia, porém, sobretudo no Antigo Testamento, refere que todas as criaturas serão encorajadas a louvar e glorificar o seu Criador, e é precisamente isso que fazem. Não são só o sol e a lua que louvam o Senhor, mas “as feras e todos os gados, répteis e aves voadoras” (Salmo 148). No Livro de Daniel lemos que todas as criaturas de Deus – baleias, pássaros, animais selvagens, gado – o devem “exaltar para sempre” (Daniel 3). Tudo o que Deus criou é bom, e por isso os animais, na sua própria natureza, na sua intrínseca bondade, exaltam e louvam Deus.

O pássaro que voa louva o Senhor, o coiote que uiva louva o Senhor, até o gato arrogante que dorme louva o Senhor – e claro que o grande urso pardo também louva o Senhor. Mas o que me espanta ainda mais é o “para sempre”. É essa a esperança orante da profecia bíblica. Mas se os animais, enquanto espécie, deixarem de existir, não serão capazes de louvar Deus para sempre.

Isaías profetiza que com a chegada da Era Messiânica escatológica, “o lobo habitará com o cordeiro, o leopardo deitar-se-á junto do cabrito, o vitelo e o leão pastarão juntos; A vaca pastará com o urso [pardo], as suas crias deitar-se-ão juntas, e o leão comerá erva com o boi” (Isaías 11,6-7).

Há uns anos uma raposa começou a entrar regularmente no terreno do nosso convento em Washington D.C. e eu comecei a dar-lhe os restos do jantar – gordura, ossos de frango, etc. Depois de algum tempo, ela começou a aproximar-se até a cerca de um metro e meio de mim, e eu lançava-lhe a sua comida diária. O meu objectivo era conseguir que ela comesse da minha mão. Alguns dos meus confrades criticaram-me por estar a alimentar um animal “selvagem”. Respondi que a estava a preparar para o eschaton. Calculei que se o nosso fundador, São Francisco de Assis, conseguiu domesticar um lobo, eu conseguiria domesticar uma raposa. No final, porém, os frades anti-escatológicos ganharam e fui proibido de alimentar a minha amiga raposa.

Contudo, São Paulo declara que “o mundo todo espera e deseja com ânsia essa manifestação dos filhos de Deus. Na verdade, o mundo ficou sujeito ao fracasso, não por sua vontade, mas porque era esse o plano de Deus. Entretanto, Deus manteve-o sempre nesta esperança: Um dia, o mundo será libertado da escravidão e da destruição, para tomar parte na gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Bem sabemos que até agora o mundo todo geme e sofre como se fossem dores de parto. Não é só o Universo, mas também nós que já começámos a receber os dons do Espírito. Nós sofremos e esperamos a hora de sermos adotados como filhos de Deus, a hora da nossa total libertação” (Romanos 8, 19-23).

Em comunhão connosco, toda a criação – estrelas, montanhas, plantas, árvores e, sim, animais – gemem, aguardando ansiosamente o dia em que será libertada da maldição do pecado que é a morte. Só quando Jesus regressar na sua gloria escatológica, e nos ressuscitar em corpo de entre os mortos, é que toda a criação poderá partilhar na gloriosa liberdade dos filhos de Deus.

Não faço ideia se todos os animais que alguma vez existiram regressarão à vida no Novo Céu e na Nova Terra. Mas acredito que nada da boa Criação de Deus se perderá, precisamente porque o bom Deus a criou boa. Tal como Deus criou toda a Criação boa através da sua Palavra, também Deus recriou toda a Criação através da sua Palavra Incarnada. E tal como Deus deu em primeiro lugar a Adão e a Eva “domínio sobre os peixes do mar e as aves do céu e sobre todos os animais que andam sobre a terra” (Génesis 1,28), assim os filhos e as filhas redimidas de Deus cuidarão da nova criação.

O Novo Céu e a Nova Terra partilharão da glória ressuscitada da humanidade – não haverá mais gemidos e decadência. Esta é a esperança que reside na plenitude da Era Messiânica. Quando Jesus surgir no seu trono celestial, ouvi-lo-emos proclamar: “Eis que faço novas todas as coisas” (Revelação 21,5).

Assim, a minha esperança é de que se não posso fazer festinhas ao urso pardo nesta Criação, podê-lo-ei na Nova Criação. E estou convencido de que ele me dará um grande e entusiástico abraço de volta. Mais importante, exaltaremos e louvaremos juntos, para sempre, cada um de acordo com a nossa natureza, Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador.


Thomas G. Weinandy, OFM, um autor prolífico e um dos mais conhecidos teólogos vivos, faz parte da Comissão Teológica Internacional do Vaticano. O seu mais recente livro é Jesus Becoming Jesus: A Theological Interpretation of the Synoptic Gospels.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no domingo, 6 de Fevereiro de 2022)

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