Wednesday, 16 September 2020

O Estilo de Vida Liberal é Caro, muito Caro

Randall Smith

Muitas pessoas partem do princípio de que uma sociedade “progressista” na sua visão dos valores morais seria naturalmente “progressista” em termos económicos, que quem acredita na distribuição mais equitativa dos bens acreditaria também em padrões mais permissivos de comportamento.

Não nego que exista essa percepção, mas a realidade acaba muitas vezes por ser o contrário daquilo que os jovens progressistas pensam. Aqueles que gostariam de assegurar uma distribuição mais equitativa da riqueza na economia e um maior respeito pelo ambiente estão de facto a exigir uma autodisciplina considerável, do género que normalmente não exigimos a quem vive um estilo de vida de libertinagem.

Pensam que é descabido pedir a um homem para disciplinar os seus apetites sexuais, mas ao mesmo tempo esperam que ele abdique do seu apetite por dinheiro, estatuto social e poder?

É estranho dizer por um lado que “não é necessário ter a disciplina para ser fiel à sua mulher e filhos”, mas por outro insistir que alguém deva sentir-se responsável perante toda a humanidade no que diz respeito à reciclagem das embalagens de plástico. Se um homem não consegue disciplinar os seus apetites ao ponto de ser fiel aos seus próprios filhos e à mulher a quem jurou fidelidade até à morte, diante de Deus, então porque haveríamos de pensar que seria suficientemente disciplinado para ser fiel às gerações que virão depois da sua morte? Não nos deve surpreender, portanto, que à medida que as sociedades se tornam moralmente mais “progressistas” vão acumulando mais dívidas para serem pagas pelas gerações futuras.

A laxidão que os “progressistas” apoiam no campo da moral pessoal é apenas mais uma variante do individualismo autónomo que pretendem combater no campo económico. E cada vez que se enfraquecem os elos sociais da sociedade, sobretudo aqueles que são desenvolvidos dentro da realidade altruísta que é o casamento e a família, resulta numa diminuição do capital social necessário para assegurar que as pessoas continuem dispostas a partilhar abundantemente com os outros sem medo de ficarem indigentes.

Quando se fomenta maiores níveis de confiança social as pessoas ficam mais dispostas a partilhar. Quando temem que mesmo as suas relações mais próximas são baseadas em nada mais do que o prazer ou a realização do outro, esta vontade esvai-se e formam-se muros de proteção. Quando isto acontece, a única maneira de garantir mesmo as formas mínimas de colaboração passa a ser através da coação governamental. É mesmo isso que queremos?

Se não quer o Governo a intrometer-se na sua vida privada, surpreendo-o verdadeiramente que o vizinho do lado não queira o Governo a intrometer-se nas suas decisões empresariais privadas? Se quer usar o poder coercivo do Governo para obrigar os médicos a praticar abortos, então fica mesmo espantado ao saber que o seu senhorio quer usar os poderes coercivos do Governo para o despejar quando não paga a renda?

E da mesma forma, se insiste que o Governo não tem nada que lhe dizer quanto é que deve pagar aos seus trabalhadores mas ao mesmo tempo quer usar os poderes coercivos do Governo para favorecer o seu negócio, então porque é que se surpreende ao ver que os “progressistas” resistem à intrusão do Governo para umas coisas e encorajam-na para outras?

Numa cultura em que a liberdade significa sobretudo liberdade de constrangimentos, liberdade para fazer o que quero e não a liberdade para me dedicar ao bem dos outros, rapidamente se torna claro para os jovens que a liberdade que lhes está a ser “vendida” todos os dias pelas elites culturais – a liberdade de autocriação, a liberdade de criar uma identidade através dos bens de consumo, a liberdade de ir em busca do que é excitante e de viver como as celebridades nos anúncios – é cara, muito cara.

A vida “de artista” em Nova Iorque é cara. A mansão é cara e os colégios da moda são caros. Há estudos que revelam que mais de um quarto das pessoas que ganham mais de 100,000 dólares por ano dizem que “mal conseguem aguentar” e que não têm dinheiro suficiente para as suas necessidades mais básicas. A liberdade da autocriação autónoma é cara; o estilo de vida das celebridades também.


Los Angeles e Nova Iorque são viveiros de eleitores de causas socialistas, mas estão longe de ser exemplos morais de igualdade de rendimentos. As pessoas que vivem em casas e apartamentos caros e que gastam dinheiro em bares e discotecas, mas que depois exigem que o Governo faça “mais pelos pobres” têm muito pouca credibilidade.

Saia desse apartamento caro, vá viver para uma cidade modesta e um bairro simples, envie os seus filhos para as escolas públicas locais ou para uma modesta escola católica que serve de facto os pobres, e aí talvez tenha alguma credibilidade. Caso contrário é uma fraude. Não pode exigir aos outros que abdiquem das coisas reles de que gostam enquanto fica com as coisas sofisticadas que lhe dão prazer a si.

Os adeptos do estilo de vida liberal nunca conseguirão alcançar a justiça social se usarem a sua preocupação pela justiça social como os fariseus usavam os seus símbolos religiosos, como sinal da sua própria presunção. “Alargam os seus filactérios e aumentam as franjas dos seus mantos”; “tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens”; quando vão dar dinheiro aos pobres mandam tocar as trombetas para serem respeitados pelos outros.

Demasiados americanos, sejam autoproclamados “liberais” ou “conservadores”, acreditam que aquilo que torna a América grande é o facto de os indivíduos poderem escolher o seu próprio conceito de bem, desligado das exigências e das necessidades dos outros e alcançá-lo como um direito divorciado de qualquer obrigação aos outros ou ao bem comum.

Tanto os “conservadores laissez-faire” como os “progressistas” são chamados a compreender que a América apenas será “grande” quando fizermos nossas as orações os versos, demasiadas vezes ignorados, do “America the Beautiful”:

 

América! América!

Deus corrija cada uma das tuas falhas,

Confirme a tua alma na autodisciplina,

A tua liberdade na lei!

 

América! América!

Que Deus refine o teu ouro

Até que todo o sucesso seja nobreza

E todo o lucro divino!

 

América! América!

Que Deus te dê a sua graça

Até que o lucro egoísta deixe de manchar

O estandarte dos livres!

 

 

Randall Smith é professor de teologia na Universidade de St. Thomas, Houston.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na quarta-feira, 9 de Setembro de 2020)

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