Wednesday, 28 March 2018

Duas Juventudes

No passado Domingo de Ramos, 2.500 alunos de 150 universidades em todo o mundo reuniram-se em Roma para o UNIVFORUM 2018, um encontro de uma semana para aprofundar a compreensão do catolicismo e a sua relação com o futuro do mundo. O Opus Dei tem organizado encontros do género desde 1968. Os delegados participarão numa audiência papal a apresentarão ao Santo Padre dinheiro que angariaram para caridade, bem como um mosaico de Maria, Mãe da Igreja (para os cristãos na Síria). As suas deliberações terminam no Domingo de Páscoa.

Estes não são, convém deixar claro, os 305 jovens delegados convidados pelo Papa Francisco para o encontro pré-sinodal que decorreu no Vaticano na semana passada, que eu descrevi noutro artigo. Esses jovens concluíram as suas actividades no mesmo Domingo de Ramos, apresentando ao Papa um relatório nalguns pontos útil, noutros previsivelmente contraditório e heterodoxo, em particular na esperança de que a doutrina da Igreja se possa adaptar de certa forma – independentemente das Escrituras, da tradição e das próprias palavras de Jesus – aos actuais modos de vida, em claro contraste com o Cristianismo histórico.

Resumindo, nestas duas semanas antes da Páscoa tivemos, em Roma, duas visões muito diferentes de como abordar os jovens. Admitamos, por uma questão de justiça, que ambas têm vantagens e desvantagens.

A UNIVFORUM 2018, como quase tudo o que é organizado pelo Opus Dei, é um evento bem pensado, com um enfoque claro. Inclui organizações e indivíduos que o meu colega George Weigel defende deviam estar presentes no sínodo de Outubro, pelas provas dadas em termos de sucesso de pastoral juvenil. O programa deste ano olha de forma particular para o Maio de 1968, com as suas expectativas utópicas, e pergunta se, meio-século mais tarde, as promessas de liberdade e felicidade humanas foram cumpridas.

Em contraste, a reunião pré-sinodal juntou um grupo heterogéneo (jovens católicos sérios, jovens católicos confusos, não crentes e até alguns muçulmanos). Alguns temas polémicos entraram na discussão, como por exemplo o apelo por mulheres cardeais, feito por defensores da ordenação feminina, mas em geral os delegados reflectiram os muitos temas que se esperaria ouvir de um encontro de jovens: um maior desejo por acompanhamento no desenvolvimento da fé (sem uma Igreja moralista ou julgadora), o papel das mulheres na Igreja, justiça social e alguma discordância quanto ao ensinamento da Igreja sobre sexo, casamento, homossexuais e celibato sacerdotal. Também houve questões sobre a própria existência de Deus e esperança de que a Igreja consiga explicar melhor a doutrina ou as escrituras. Alguns querem um acompanhamento mais próximo por parte da Igreja, outros temem que esse acompanhamento possa limitar a sua liberdade.

Temos aqui dois pontificados em operação. No evento do Opus Dei temos algo como a abordagem de João Paulo II no início de Veritatis Splendor, em que de evoca o “jovem rico” dos Evangelhos que pergunta a Jesus o que deve fazer para ter a vida eterna. A resposta, claro está, é deixar tudo e segui-lo. O enfoque principal é trabalhar sobretudo com jovens já comprometidos com a Igreja e ajudá-los a comprometer-se ainda mais para, só então, sair para convencer outros.

A segunda abordagem, do Papa Francisco, parte do princípio que muitos já abandonaram a Igreja porque também eles não gostam do que Jesus pede. Mas outros porque ainda ninguém lhes desafiou, ou porque não compreenderam bem. Ou então por causa de obstáculos colocados no seu caminho pela própria Igreja, que precisam de ser removidos.

Francisco costuma convidar as pessoas a falar sem medo e sem hesitações, pensando que “sempre se fez assim”. Esse convite ajuda-os a sentirem-se parte de um processo e traz assuntos à superfície. Mas também é um risco, pois ameaça virar as questões ao contrário. Uma boa parte dos participantes do encontro pré-sinodal – com pouca experiência de Deus ou do mundo – sentem-se menos chamados a mudar-se a si mesmos e mais a dizer; bem, se não é preciso fazer as coisas como sempre foram feitas, então é sobretudo a Igreja que deve mudar.

E deve, como devemos todos, se tenciona manter-se viva. A questão está em saber como. O grande Cardeal Newman costumava dizer que “a mudança é prova de vida e ser perfeito é ter mudado muito”. Mas há uma diferença entre uma mudança que conserva e enaltece fielmente e mudança que transforma em algo fundamentalmente diferente. Esse tipo de perspectiva desempenha um papel menor no relatório dos jovens. E não admira, porque da parte dos adultos houve pouco encorajamento por valores como a fidelidade e a verdade. A ênfase foi para que os jovens falassem na sua própria voz – uma categoria em tempos reservada a grandes poetas e romancistas, o que significou, como é costume com jovens, que a maioria dos delegados se limitou a ecoar aquilo que tem ouvido dos seus pares.

Papa Francisco com os jovens no encontro pré-sinodal
Há aqui muita coisa que não deve admirar os padres sinodais. Alguns jovens estão a sugerir que este documento mudará o rumo da Igreja. Um escreveu mesmo no Twitter que “Se este documento não resultar numa mudança sísmica em como ministramos a, e com, os jovens, então não está a ser lido correctamente”.

Mudanças sísmicas, mudanças de paradigma – na era das redes sociais há uma grande tentação de dramatizar, mesmo que se trate de um relatório de um comité de jovens, após um breve encontro com outros, previamente desconhecidos uns dos outros, e sugestões de 15 mil seguidores do Facebook. 

Mas o terreno não mudou e, recordemos, o objectivo não é simplesmente melhor pastoral juvenil. O que queremos sempre saber é se mais jovens vão ser conduzidos a Jesus Cristo – o verdadeiro, das Escrituras, preservado pelo Espírito Santo no seu Corpo Místico, a Igreja.

O acompanhamento costumava significar família, depois paróquia e comunidade. Os jovens reconhecem isto no seu relatório – bem como a crise das famílias, o futuro incerto de muitas paróquias e a hostilidade do Estado moderno para com a religião em geral e o Catolicismo em particular. Eles compreendem que algo tem de ser feito para compensar o desaparecimento de velhas formas de formar identidade, mas não sabem bem o quê.

E aqui está outro dilema: será que se pode beneficiar da força da Fé se rejeitar os necessários juízos não de pessoas, mas de verdade e falsidade, de coisas que exigem uma decisão? Coisas que podem restaurar a família, paróquia, sociedade, uma vez que estes não têm substitutos? Se a Igreja não der uma mão orientadora firme – se querem que ela lá esteja (como os pais) se falharem, mas não querem seguir os seus conselhos – então que utilidade terá para a maioria dos crentes?

O Papa Francisco publicou recentemente o livro “Deus é Jovem”, que reflecte, em parte a famosa fórmula de Santo Agostinho sobre a beleza de Deus: tam antiqua, tam nova, “sempre antiga, sempre nova”. Os jovens que vieram a Roma a semana passada alcançaram algo de valor real, embora parcial. Resta ver se os adultos, adultos responsáveis, conseguem retirar daí algo de bom em Outubro.


Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press. The God That Did Not Fail: How Religion Built and Sustains the West está também disponível pela Encounter Books.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na Segunda-feira, 26 de Março de 2018)

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