Wednesday, 4 November 2015

Preparação para o Casamento

George Sim Johnston
Passei mais de vinte anos a dar cursos de preparação para o matrimónio na arquidiocese de Nova Iorque e, pelas minhas contas, se todos os casais a quem eu já falei se reunissem num só local, facilmente enchiam o Madison Square Garden [pavilhão desportivo com capacidade para mais de 18 mil pessoas]. De vez em quando ainda me chamam para ir dar formação a uns cinquenta e tal casais que precisam de mostrar que fizeram o CPM antes de poderem casar pela Igreja.

Escusado será dizer que aparece de tudo entre estes casais em termos de crenças e descrenças. Há muitos não-católicos e é seguro dizer que uma maioria dos católicos não sabe quase nada sobre a fé. Metade dos casais já vive junto e parecem pensar que a promessa que estão prestes a fazer não vai mudar grande coisa na sua relação. Uma prova disto é que alguns não planeiam ir de lua-de-mel depois do casamento.

E é claro que uma maioria não partilha o entendimento da Igreja em relação ao sexo. Para esta geração, o sexo é um intercâmbio consentido de prazer entre adultos, que determinam o seu significado ad hoc. Não há dados adquiridos no que diz respeito à sexualidade; é simplesmente aquilo que se quer fazer dele. Estou a exagerar, mas só um bocadinho.

No meu caso, tratando-se de Nova Iorque, alguns vêm com atitude e estão preparados para desafiar o orador durante a fase das perguntas e respostas. Alguns formadores de CPM nem aceitam perguntas, para evitar que a situação se descontrole.

Tudo isto faz com que um CPM em Manhattan seja uma das “periferias” de que o Papa Francisco tanto fala. Certamente não é uma zona de conforto para o orador. Mas o trabalho não podia ser mais importante. Na verdade, um bom CPM devia ser uma prioridade para qualquer bispo, ao nível de um bom seminário e programa de catequese continuada. Em muitos casos é a última oportunidade que a Igreja tem para chegar às pessoas que nele participam.

Atitude errada...
Os formadores dos CPM tendem a escolher uma de duas abordagens, nenhuma das quais funciona. Uma é a abordagem fácil e terapêutica. Um diácono de meia-idade aparece e faz umas piadas. Usa muitos chavões psicológicos e evita falar de qualquer ensinamento da Igreja que ache que não vai cair bem com os jovens. Isto pode ser constrangedor. Mesmo os não-crentes entre os formandos ficam irritados perante o espectáculo de um orador a tentar pôr-se ao nível do que supõe serem os hábitos dos jovens.

Depois há os rigoristas. Sobretudo no que toca a sexualidade, estes vêm preparados para dar um sermão. Anunciam, por exemplo, que a contracepção é um pecado mortal. O pecado mortal é certamente algo que existe, e o uso de contraceptivos é certamente desordenado. Mas quando um formador de CPM usa o termo “pecado” num curso, metade dos formandos desligam e já não vão ouvir mais nada do que o orador tem para dizer. Acabou de cometer um erro para o qual o magistério está sempre a alertar – legalismo.   

Eu sei que ao escrever isto posso estar a perturbar os católicos conservadores que pensam que a doutrina deve ser expressada de forma clara e firme. Não podia estar mais de acordo. Mas concordo também com o Papa Francisco quando este diz que a primeira obrigação da Igreja é ir ao encontro das pessoas onde elas estão, com uma preocupação pelo seu bem-estar. Por isso a primeira coisa que temos de perceber é que esta é uma geração que tende a não aceitar bem a imposição de regras ou a ideia do pecado como uma categoria teológica.

Mas ao mesmo tempo, estes casais procuram orientação. Estão rodeados de casamentos infelizes e não querem repetir os mesmos erros que viram cometidos pelos seus pais ou amigos. Querem fazer a coisa certa. Ouvirão de bom grado conselhos sobre temas como comunicação e como gerir (e ultrapassar) uma discussão. Serão receptivos a histórias sobre o casamento dos oradores, que possam ser instrutivas e divertidas.

Então a conversa pode tocar temas mais profundos. O orador pode desafiar os casais com ideias que poderão nunca ter ouvido articuladas. Por exemplo, que o verdadeiro amor está na vontade e não nas emoções. Que o amor num casamento é a decisão de continuar a tomar decisões. Que um “dom de si” radical enriquece a vida de formas inesperadas. Que o ensinamento de Cristo sobre a indissolubilidade do casamento é um apelo a fazer com que este corra bem – a felicidade não é algo fácil de alcançar. Que os métodos naturais de planeamento familiar melhoram a vida sexual – se vamos ter relações sexuais com a mesma pessoa durante trinta ou quarenta anos, tem de haver um pouco de ascetismo para que tudo corra bem. Que os filhos são o nosso maior legado – mesmo o trabalho mais bem feito no escritório acabará por ser um conjunto de dossiês no sótão ou será apagado pelos informáticos da empresa.

Atitude certa...
O orador – ou oradores, porque os casais são os melhores a fazer isto – deve pelo menos deixar a impressão de que a Igreja pensou profundamente sobre estes assuntos. Os ensinamentos católicos sobre a sexualidade, por exemplo, não foram inventados no início da Idade Média por um bando de monges celibatários a tentar reprimir a vida sexual de toda a gente. Pelo contrário, baseiam-se numa leitura profunda do homem e da mulher enquanto seres sexuais. Devem ajudar-nos a florescer. Como diz São Tomás, Deus só se ofende com actos que não são para o nosso bem. Ao mesmo tempo, delicia-se por vivermos de forma mais completa a “lei do dom” inscrita no nosso ser.

Acima de tudo, devíamos persuadir os casais de que tanto eles como a sociedade têm a ganhar se eles se esforçarem com os seus casamentos. Bem como a Igreja. Há verdade na ideia de que o declínio da família é que conduziu ao declínio da religião, e não o contrário. Ao fim do dia os casais poderão nem ter ideia da quantidade de doutrina que acabaram de absorver. Geralmente será melhor assim. Talvez até voltem a falar do assunto em casa.


George Sim Johnston é autor de “Did Darwin Get It Right? Catholics and the Theory of Evolution” (Our Sunday Visitor).

(Publicado pela primeira vez no sábado, 31 de Outubro de 2015 em The Catholic Thing)

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