Wednesday, 13 May 2015

Uma Nova Retórica para Defender o Casamento?

Daniel McInerny
Um amigo comentava na sua conta de Twitter: “Socorro, estou a ser governado por Anthony Kennedy!”

Eu compreendo a sensação. O juiz Kennedy tende a ser o voto decisivo no Supremo Tribunal. Frequentemente, ao que parece, nas grandes questões constitucionais que dividem a nossa nação, vemo-nos obrigados a esperar ansiosamente a sua opinião.

E mais do que nunca agora que o Supremo Tribunal pondera a constitucionalidade do “casamento” entre pessoas do mesmo sexo. Qual será a decisão de Kennedy em Junho? Será que se vai juntar aos juízes conservadores, recusando tornar a redefinição do casamento um direito constitucional? Ou irá lançar-nos ainda mais para a escuridão?

O tempo dirá. Mas tenham em conta que, na melhor das hipóteses, o que o Supremo Tribunal fará no próximo mês é aquilo que não fez com o Roe v. Wade, isto é, devolver a questão aos eleitores nos seus respectivos estados. Como é que nos temos saído com o processo democrático? Da última vez que verifiquei, o casamento entre pessoas do mesmo sexo era legal em 37 dos nossos 50 estados. [Na verdade, o casamento homossexual apenas foi legalizado por via democrática em 11 estados, seja através dos governos estaduais ou referendos. Nos restantes 26 a questão foi decidida por tribunais estatais ou federais, em muitos casos contra a vontade expressa em referendo ou pelas decisões dos governos locais.]

Por isso, independentemente da decisão do Supremo Tribunal no próximo mês, os defensores do casamento tradicional terão diante de si uma tremenda batalha cultural e política. E a maior dessas batalhas é a cultural.

O que é que eu quero dizer por batalha cultural? Quero dizer o esforço para reformar – e para nós, católicos, evangelizar – os corações e as mentes, os hábitos e as práticas, dos nossos concidadãos.

O recurso a metáforas militares para descrever este trabalho é inspirador, mas também apresenta dificuldades. Termos como “batalhas” ou “guerras” culturais invocam imagens de protesto e revolta. Mas enquanto o protesto e a revolta, se usados com prudência, podem ser de facto necessários para defender o casamento tradicional, temos de admitir que não são um caminho tipicamente frutífero para tocar e converter mentes e corações.

Isto não significa que a metáfora de uma “batalha” cultural não tenha a sua utilidade. Mas talvez seja necessário pensar no campo de batalha cultural de uma forma diferente. Pensemos na imagem do Papa Francisco da Igreja como um hospital de campanha depois de uma batalha. Deste ponto de vista, usando a metáfora militar, a Igreja cumpre o papel de médico para as vítimas da impiedosa chacina da nossa cultura secular contra todos os que a ela se opõem. Sofreram-se grandes danos e chegou a hora da triagem e das cirurgias. 

Esta é uma imagem apropriada da nossa cultura no que toca à homossexualidade e ao casamento homossexual. É um campo de batalha cheio de almas feridas, desesperadas por uma cura de que nem sabem que precisam. E é também uma imagem apropriada do papel principal do católico perante este cenário: a nossa obrigação é montar um hospital de campanha e levar a cabo o trabalho misericordioso da cura.

Mas como é que se curam estas feridas? Como é que se inicia uma conversa com alguém firmemente comprometido com a ideologia do movimento pelos direitos dos homossexuais?

Esta é uma questão que fazemos bem em contemplar. Temos de pensar mais a fundo sobre como dialogamos com a nossa cultura no que toca a esta questão.

A retórica da vizinha
é melhor que a minha?
Não digo que seja necessário desenvolver melhores argumentos teológicos e filosóficos. Em relação às grandes e pequenas premissas encontradas no Catecismo e entre os intelectuais que se encontram na linha da frente a defender o casamento tradicional do ponto de vista natural, penso que não há grande coisa a mudar.

Antes, o que temos de fazer é trabalhar o aspecto retórico dos nossos argumentos. Isto é, precisamos de pensar em formas persuasivas – que não apenas verbais – de alcançar aqueles que não têm ainda ouvidos para ouvir os argumentos abstractos.

Pensem só, por momentos, nalguma da retórica popular usada pelos defensores dos direitos homossexuais, tal como o lema “Amor é Amor” e o termo praticamente radioactivo “intolerante” que tem sido usado mais e mais para atacar os opositores ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. Pensem também no poder de persuasão que têm as celebridades divertidas ou bonitas, sobretudo entre os jovens, quando representam homossexuais na televisão ou nos filmes, ou simplesmente quando saem em defesa da ideologia. E recordando que a linguagem persuasiva nem sempre é verbal, que dizer daqueles pequenos autocolantes azuis com o sinal “=” a amarelo que os condutores colocam nos pára-choques para mostrar que defendem a “igualdade no casamento”. 

Tudo isto é retórica. E o discurso persuasivo é algo em que o movimento dos direitos homossexuais se tem especializado. Por isso temos de nos perguntar: Qual é a nossa retórica? O que é que estamos a fazer para tornar os nossos argumentos não só lógicos como também atractivos?

Se estão à espera que eu vos dê uma resposta brilhante a esta questão, então lamento desiludir-vos. É algo sobre o qual apenas agora comecei a pensar e exige mais reflexão cuidadosa.

Para começar, sou céptico em relação ao termo “casamento tradicional”, sobretudo quando direccionado a jovens, que raramente estão à procura de formas de se tornarem “tradicionais”.

Como é que transmitimos, de forma divertida e persuasiva, a ideia de que o casamento é sobre complementaridade, que o sexo tem a ver com bebés e que se enriquece com as diferenças entre homens e mulheres, que as crianças precisam de um pai e de uma mãe, que o tecido social desgasta-se quando o casamento se torna um “conceito aberto”? Estes são os nossos desafios retóricos.

Quando eu e a minha mulher falamos a casais sobre os métodos naturais de planeamento familiar ela diz sempre que esta é a forma “natural” de ter filhos. É uma forma de atrair jovens sem grande formação para as verdades da Igreja através de algo – “o regresso à natureza” – pelo qual provavelmente já sentem um grande apelo. Se me for permitido o elogio, trata-se de uma excelente forma de usar retórica.

E é precisamente esse o tipo de discurso que temos de desenvolver no que diz respeito à homossexualidade e ao casamento homossexual.

Por isso coloco-vos a questão, que exigirá o trabalho conjunto de muitas mentes: Quais são as vossas ideias?


Daniel McInerny é filósofo e autor de obras de ficção para crianças e adultos. Mais informação em danielmcinerny.com.

(Publicado pela primeira vez na sexta-feira, 8 de Maio de 2015 em The Catholic Thing)

© 2015 The Catholic Thing. Direitos reservados. Para os direitos de reprodução contacte: info@frinstitute.org

The Catholic Thing é um fórum de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade Religiosa com o consentimento de The Catholic Thing.

1 comment:

  1. Absolutamente extraordinário, caro Filipe. Ou seja, a excelente forma de usar a retórica, para os católicos usarem no que diz respeito à homossexualidade e ao casamento homossexual, é o tipo de discurso do "regresso à natureza"?
    Passando ao lado dos factos, como o casamento não existir "na natureza" ao contrário da homossexualidade; e ao lado de séculos de doutrina, do voluntas ut voluntas às virtudes cardeais, o autor não consegue sequer perceber - ou ouvir - que a questão da natureza e naturalidade (da atracção) é o argumento central de quem pretende convencer ou, como escreve, atacar.
    Consegue, nesta tentativa de fazer o casamento sexy - como no título original -, desrespeitar a doutrina e, ao mesmo tempo, dar o ponto ao "inimigo".

    No fundo, não se trata de nova retórica, mas de roupagem moderninha para o básico - "o que eles fazem não é natural". E sim, "eles", porque sobre os homossexuais nem uma palavra, apenas lutar contra quem está "comprometido com a ideologia do movimento pelos direitos dos homossexuais". Ficamos sem entender se o autor já os dá como perdidos, na "hora da triagem e das cirurgias"?

    E isso, da batalha, leva-me à dúvida sobre o que me é mais chocante neste artigo: se a vontade de ir para a guerra (e, depois das cardeais, lá vão as virtudes teologais pela borda) se o ridículo do armamento.

    Com um abraço amigo do
    Diogo Henriques

    ReplyDelete