Wednesday, 10 April 2013

Odiar o Papa?

Austin Ruse
Que coisa terrível que é um suposto católico odiar o Papa. Ódio é uma palavra muito forte? Que coisa terrível que é não gostar do Papa, ficar enraivecido com o Papa, ou desconfiar sequer do Papa. Mas lendo alguns blogues tradicionalistas nos tempos mais recentes vê-se tudo isto.

Claro que muitos de nós ficámos um bocado preocupados ou até desiludidos quando foi anunciado o nome de Bergoglio. Quase nunca tínhamos ouvido falar dele. Da Argentina? Interessante, mas essa não é uma das terras da teologia da libertação? E ele não tinha sido o candidato progressista contra Ratzinger em 2005? Afinal esta última acusação era simultaneamente verdade e mentira. Verdade que era o candidato dos progressistas, mentira no sentido em que ele não o queria.

Eu estava nas Nações Unidas quando saiu o fumo branco, num painel convocado pela Santa Sé para discutir a violência contra as mulheres. A sala de conferências estava cheia de feministas radicais que adoram ir a estes eventos para poder atacar a Igreja. Quando saiu o fumo branco os telefones de católicos fiéis começaram a tocar em todo o mundo. Também naquela pequena sala na ONU se podiam ver algumas caras felizes, incluindo o núncio, radiante.

Muitos de nós encontramo-nos no bar da ONU, ligámos os computadores e esperamos pelo “Habemus Papam”. Foi uma espera agonizante. Estava com um grupo grande de estudantes de Steubenville e quando foi anunciado Bergoglio o nosso entusiasmo esmoreceu significativamente. A confusão era palpável. Bergoglio quem?

Então começámos a receber emails de amigos com citações sobre as lutas que Bergoglio tinha travado em defesa da vida e da família na Argentina. Eram muito fortes. Ninguém espera que o Bispo de Roma seja heterodoxo nos assuntos mais importantes do dia, mas falará abertamente deles? Claramente este novo Papa fá-lo-á.

Quando Francisco baixou a cabeça e pediu a nossa bênção os estudantes com quem eu estava choraram e rezaram por ele ali mesmo. As feministas radicais que estavam à nossa volta percebiam o que se estava a passar – e estavam horrorizadas.

Mas imediatamente os nossos amigos tradicionalistas e os seus blogues começaram a encher-se de queixas. Um amigo meu no Facebook alertou que Bergoglio “não é amigo da missa tridentina”, o sine qua non do Tradicionalismo. Esta suposta frieza de Francisco pela missa tradicional tem sido repetida vezes sem conta desde a sua eleição.

Para além da missa tridentina, os tradicionalistas estão sempre alerta para detectar qualquer coisa que lhes pareça modernismo. Será que o turíbulo foi abanado o número certo de vezes tanto à esquerda como à direita?

Taylor Marshall - Uma voz sensata no meio da raiva
Taylor Marshall – um ex-padre anglicano convertido ao Catolicismo que trabalhou durante uns tempos na Catholic Information Center em Washington D.C. – é chanceler do Fisher More College no Texas e um autor influente nos meios tradicionalistas, mas com um estilo sensato. No dia 14 de Março, meras horas depois da eleição de Francisco, postou isto no seu blogue:

O Papa Francisco ainda não tinha sido eleito há duas horas e o sarcasmo começou a ser cuspido nas caixas de vários blogs. Muitos do grupo tradicional reagiram contra o Papa Francisco com palavras que eram francamente ofensivas. Se um dos meus filhos falasse assim de um padre (ou de qualquer pessoa mais velha, já agora), o rapaz levava uma palmada no rabo e uma longa estadia num quarto escuro.

Em poucos minutos do aparecimento de Sua Santidade na varanda, alguns "trads" começaram uma campanha online afirmando que ele era um perseguidor dos padres ortodoxos na Argentina. Depois disseram que proibiu a Missa Tradicional na sua diocese. Depois estavam a gozar com ele por não usar a mozeta papal encarnada. Também exprimiram desagrado sobre o facto de Sua Santidade ter rezado em italiano e não em latim. Depois, mostraram-se alarmados por ele ter tirado a estola imediatamente depois da bênção. A seguir fizeram um grande alvoroço sobre o facto de a tapeçaria que se desenrolou sobre a varanda não ser a do predecessor de Sua Santidade. E estes comentários não são sequer os piores. E nem sequer quero enumerar algumas das outras coisas que têm escrito online. [Em português aqui]

Marshall tinha razão; os blogues e as suas caixas de comentários estavam cheios de pânico, fúria, até ódio, e não eram só os habitués dos comentários que se estavam a passar. Horas depois do anúncio a Remnant TV entrevistou John Rao, um comentador frequente, que é também um dos mais proeminentes líderes dos círculos tradicionalistas raivosos. Rao afirmou: “As perspectivas não são boas. Parece que a eleição resultou de maquinações políticas por parte de um ou outro elemento daquela facção do Colégio dos Cardeais que está associado ao suposto espírito do Concílio, seja como for que interpretam isso, e que não quer saber se a Igreja morre, desde que esse espírito se mantenha.”

Príncipes da Igreja que não querem saber se a Igreja morre? Pensem bem no que estas pessoas estão a dizer. Que arrogância, que falta de fé. Que atitude de dissensão em reclamar a autoridade de se pronunciar sobre o que é verdadeiramente católico ou não.

Quando eu era tradicionalista tínhamos um grande desprezo por João Paulo II. Quase passei ao lado do seu pontificado inteiro – até sair dessas fileiras. Eles gostavam mais do Bento XVI por causa da bênção que ele deu à missa tridentina e as suas práticas mais tradicionais em geral. Mas agora dizem que Bento XVI frustrou o Espírito Santo ao resignar e que a elevação do Papa Francisco é o castigo.

Que bênção que foi, naquele dia, poder estar com estudantes católicos fiéis que choraram de alegria ao ver o nosso novo Santo Padre, e que dor de alma são aqueles que ficam zangados só de o ver, que ainda estão zangados e que sempre estarão.


Austin Ruse é presidente do Catholic Family & Human Rights Institute (C-FAM), sedeado em Nova Iorque e em Washington D.C., uma instituição de pesquisa que se concentra unicamente nas políticas sociais internacionais. As opiniões aqui expressas são apenas as dele e não reflectem necessariamente as políticas ou as posições da C-FAM.

(Publicado pela primeira vez em www.thecatholicthing.com na Sexta-feira, 05 de Abril de 2013)

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2 comments:

  1. Muito bem escrito! Obrigado...

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  2. Não foram só os estudantes que se comoveram... sei de não crentes que começam a ver o rosto de Jesus na nossa Igreja e estão a ser tocados.... Obrigada ao Santo Espírito que escolheu este querido Papa Francisco

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